terça-feira, 27 de setembro de 2016







                     CURRICULARES E OPCIONAIS





 


A educação do país faz tempo que ocupa lugar humilhante no ranking mundial. O motivo de tal descalabro todos sabem e questionam, é a ineficiência do ensino no Brasil, desde o básico ao médio, com o que patinamos no atraso, sem que se possa alcançar as demais nações que primam pelo nível educacional e a favor do desenvolvimento, o que todos almejam. A MP lançada pelo governo neste 22 de setembro é para ser uma revolução no ensino brasileiro. Por enquanto  causa mais dúvidas, que certezas. Mas o que se cogita, desde quando nos vimos na situação de inferioridade, é fazer alguma coisa. O sino de alarme toca sem parar desde a subida de Lula ao poder, e lá se foi mais de uma década que o presidente de poucas letras foi eleito por um povo idem. Deu no que deu.

O rendimento escolar é pífio, os gastos na educação são elevados, mas os recursos mal administrados, tanto financeiros quanto de pessoas. Tantos jovens abandonam os estudos por falta de estímulo para que prossigam e tenham um futuro melhor. A mudança proposta pela medida provisória que Michel Temer acaba de assinar é para que o aluno aprenda numa escola que funcione de verdade, pois o que acontece hoje é o professor despreparado e mal remunerado fingir que ensina, enquanto os alunos fingem que aprendem, os que ainda ficam nas salas de aula, pois a fuga é grande. O americano Richard Feynmam, prêmio Nobel da Física, em visita a nosso país nos anos 50, comentou sobre nosso ensino: “um currículo tão extenso, e jovens que sabiam tão pouco”.

Sabe-se de antemão que o ensino médio brasileiro patina sobre o básico. Focar então no essencial, eliminando a sobrecarga de matérias, de pouco interesse para os alunos, para que haja  melhor aproveitamento. As matérias obrigatórias serão reduzidas a apenas três: matemática, português e inglês. As demais, opcionais,  propondo-se ainda eliminar educação física e arte, o que parece até castigo, não querem muito estudo, também não vão desperdiçar tempo saltando, correndo, nem pintando o sete. A coisa precisa ser bem equacionada para que as limitações não agravem a situação de indigência em que vivemos.

As promessas são de melhoria substancial, se forem concretizadas as mudanças, o que só deve acontecer a partir de 2018. No exterior vem dando certo, não querer que todos entendam de tudo, ou a maioria fique sem entender nada. Grave equívoco do nosso país, com uma população ainda sujando as fraldas. Tanto que, se o Nobel visse hoje as escolas violentas e anárquicas que temos no Brasil fecharia os olhos e taparia o nariz. Quem podia imaginar a que ponto chegamos, não de avanço no conhecimento, mas em falta de disciplina nas escolas, com tráfico de drogas nos pátios e até tiroteio em sala de aula, local que era respeitado no passado, quase como um templo!

E como entender que o mundo na década de 50 era menos tecnológico? Acreditava-se na possibilidade de uma humanidade que evoluía, com a filosofia, a sociologia, e tudo o mais que abria as mentes em direção ao pensamento livre - para poucos, bem verdade. O preço pelo livre pensar que a sociedade hoje não está disposta a pagar para ver, o caso da “ideologia dos gêneros”, por exemplo. Uma das “opcionais”? O ensino pode melhorar ao focar naquilo que interessa ao aluno aprender e a sociedade quer pagar por isso. Um adolescente não mais se descabelar para aprender tantas matérias, quando deve mirar nas que fazem parte de seus objetivos futuros. Além do mais ninguém precisa ser uma enciclopédia, quando tem a internet, que pode nos abastecer de todo conhecimento, ao simples toque na tecla do computador.  


segunda-feira, 12 de setembro de 2016






                                                        FÁTIMA

       

        

           Vou-me embora pra Pasárgada/ Lá sou amigo do rei/ Lá tenho a mulher que eu quero/Na cama que escolherei... Manuel Bandeira suspira por essa Pasárgada imaginária, em que possa gozar a liberdade para fazer o que quer.  Lá a existência é uma aventura de tal modo inconsequente. Desejo de viver a urgência dos prazeres, das mortais sensações. Não seria melhor ir para um lugar de bênçãos, agradecer pela vida, pela fé que transforma, e faz a pessoa viver mais consciente e feliz?  Um lugar especial é Fátima, pequena cidade portuguesa, onde fica o Santuário em homenagem a Mãe do Rei dos reis. Se em Pasárgada o poeta pode chamar a “mãe d´água” para contar-lhe histórias, em Fátima posso chamar N. Senhora para contar-me uma bela lição de amor e de vida.
      
         Vou embora para Fátima, lá sou amiga de uma rainha, a Rainha da Paz. Penso o quanto seria bom viver na pequena e encantadora cidade de Portugal, que surgiu com as aparições da Mãe divina aos três pastorzinhos, que vai fazer 100 anos, em 1917. Estive há pouco em Fátima, quando então senti a fé vibrante dos peregrinos que visitam o local de fé. A felicidade que é consequência da fé e amor pela vida, no que ela tem de santidade e paz. Aqui na minha pátria querida também posso ser feliz, mas elucubro como seria bom viver no exterior, longe dos problemas nacionais. E eu possa ver de fora o Brasil encontrar o caminho para seguir em direção a melhores dias, resolvidas as dificuldades políticas e econômicas.
       
        Nosso país, antiga colônia portuguesa, solo rico e abençoado, com um povo que vive a religiosidade católica, em sua maioria. A essa tradição junta-se a africana e indígena, também vigente entre os brasileiros. Como diz Fernando Pessoa: “Tudo vale a pena se a alma não é pequena”. Portugal, nosso avozinho e a África nossa avozinha. A fé é um bem importante  para a formação do homem, esse animal racional, que evoluiu em sua humanidade para o que conhecemos hoje como religião e civilização. Matar uma é matar a outra. A barbárie sempre à espreita... Cuidado! Há pouco o Cardeal D. José Saraiva Martins, presidente do 24º Congresso Mariano Internacional, encerrando o evento na Cova da Iria, proferiu as seguintes palavras: “Fátima é uma escola de verdade porque nos defende da fábula, nos ensina a encarar a realidade e o coração de Deus”.        

domingo, 11 de setembro de 2016






         

         
             MANSFIELD PARK  E O TERRORISMO





        O terceiro romance de Jane Austen, de 1814, tem como cenário uma propriedade de Northamptonshire, e acontece como um conto de fadas. Eram três irmãs Ward: Maria, que adota o título de Lady Bertram ao se casar com Sir Thomas, dono de Mansfield Park; a Sra. Price, mãe de Fanny a protagonista da história; e a  Sra. Norris, casada com o reverendo local. O casamento uma espécie de adoções da mulher pelo homem, o status advindo dessa união, numa época em que a função primordial da mulher era conquistar um “bom partido”, o que nem todas as belas e prendadas mulheres conseguiam, o número delas insuficiente. As feias acabavam por escapar das garras de um marido ruim. A sorte dependendo de certos arranjos, e Lady Bertram se dá bem, o que não acontece com sua irmã, que está em dificuldades, e sua filha vai para a adoção. De pronto a Sra. Norris recusa receber a sobrinha, que vai para o lar de Lady Bertram. Fanny Price troca, pois, a decadente Portsmouth por novo lar, que não é um paraíso, mas onde pode aspirar a melhor futuro. As mudanças que ocorrem a qualquer um, com obstáculos a enfrentar, sem dia e hora para acontecerem, o perigo de cair em desgraça.
        
        Jane Austen tem como exemplo a adoção do irmão pelos Knights, mas a pessoa adotada no seu romance é uma mulher, sem direito a nada, diferente de Eduard Austen, herdeiro dos pais adotivos. A Sra. Price chega a estranhar que Lady Bertram tenha escolhido uma filha e não um filho para adotar, as mulheres pouco valorizadas. Detecta-se a falta de instinto materno na Sra. Norris, também em Lady Bertram. Intrigante que a realização da mulher estivesse exclusivamente por conta do matrimônio e maternidade, quando tal instinto nem existiria, segundo as feministas. Mas o romance de Austen anuncia a moral vitoriana, uma cultura de respeito humano, em que a solidariedade são valorizados, e que não se perca o sentido da vida. E nos perguntamos, qual o bem de uma mãe de família  omissa e irracional, como Lady Bertram? E que respeito tem uma esposa  racional e maldosa de um clérigo, como Sra. Norris, que julga as pessoas por sua origem?
         
          Fanny é a personagem principal de uma fantasia literária, cujo feminismo é  calmo, moralista, a uma distância considerável das feministas do século XX, que podem ser herdeiras do feminismo das outras personagens da história de Jane Austen.  Maria e Júlia, irmãs de Edmund e Tom, filhos do dos donos da casa, são ativas e barulhentas, causando estranheza na recém-chegada. E o quanto faz barulho a instável Mary, irmã de Henry, os intruso no paraíso. É como se essas personagens dissessem: precisamos aumentar o barulho e andar mais depressa. São anti-heroínas, conquanto mais simpáticas aos leitores que Fanny, a heroína da história. São Tomé duvidou da fé dos apóstolos fundadores da religião dos primeiros tempos. O protestantismo viria dessa linhagem, a qual acredito pertença Sir Thomas, o senhor de Mansfield. Mas a criação intelectual de Austen não é de cunho religioso, mas crítica e intransigente. A difusão laica da moral através de uma obra literária, que transmite aos leitores os preceitos éticos do protestantismo, responsável pela formação da caráter inglês, assim como a fé professada. A arte de escrever como meio de expressão e instrução, afinal foi Lutero quem primeiro traduziu a Bíblia para o dialeto local e imprimiu o texto sagrado. A liberdade de  expressão  inaugurada através desse feito heroico. Fanny pensa como a autora, que a certa altura se parece com a maldosa mulher do pastor, a Sra. Norris, sua tia e inimiga, até mesmo como Mary Crawford.
       
            Portsmounth é o paraíso definitivamente perdido de Fanny, pela tragédia que nele se instalou. Uma tragédia pessoal, assim como existe a tragédia coletiva das divergências religiosas que resultam em guerras. Mas Mansfield não é também um paraíso, Fanny entra choque com as fúteis Julia e Maria, que só pensam em aparecer. Também não tem afinidade com Mary Crawford, que fala mal dos seus antigos pais adotivos. O pior pecado é a ingratidão para Fanny. No antigo lar Fanny tinha ainda duas irmãs, Betsy e Susan, que brigavam por qualquer coisa, e chegam a disputar uma faca, um mundo meio selvagem, o feminismo idem. Os jovens são apresentados como os pares  bíblicos: Maria e Julia; Eduard e Tom, filhos dos donos do paradisíaco Mansfield Park, mas que não são como Caim e Abel, nem Esaú e Jacó, irmãos que traem e matam, inimigos. A rica e civilizada Mansfield promove a união entre aqueles que frequentam a nobre residência. Mas quão frágeis são a educação e a civilidade daquelas pessoas. E com pouca civilidade agem também os irmãos Crowfords, Henry e Mary, fazendo o jogo do amor que dilacera corações. Henry é um personagem shakespeariano, que flerta ao mesmo tempo com Júlia e Maria, a exemplo de Henrique VIII que seduziu duas irmãs Maria e Ana Bolena. Já a teimosa Mary (a católica Mary Stuart) recebe a afeição de Edmund, herdeiro de Mansfield, mas que não lhe dá o devido valor, abrindo espaço para  Fanny. Jane Austen fantasia a realidade política e religiosa da Inglaterra à época.  Acredita a autora no poder da literatura, da arte laica, mas seu olhar é nitidamente moralista e religioso.
     
         Em Mansfield, formam-se e desfazem-se os pares, por conta dos caracteres de cada personagem envolvido. Edmund, herdeiro de Sir Thomas, a princípio, escolhe Mary como esposa, com o intuito de convertê-la. Mas a paixão romântica, fantasia teutônica de Henry por Maria, já casada, atitude apoiada por Mary, que então perde o valor diante de Edmund. Falta consciência moral em Mary, como em Maria, duas pecadora como Maria Madalena, representantes do catolicismo romano? A heroína do romance poderia ser Mary, mas ela se torna a vilã. E quem recebe o título é a virtuosa Fanny, que no final vai ficar com Edmund a quem desde o início quis conquistar, e já havia rejeitado Henry, antes da fuga com Maria. Fanny é grata, altruísta, bondosa, correta, como deve ser uma verdadeira alma cristã. Para os atuais leitores de Jane Austen a protagonista desse romance é uma chata, mas ela pensa de acordo com a autora, na sua fantasia literária, sendo filha de um pastor da igreja anglicana.
      
         O protestantismo sendo mais austero que o catolicismo, o que seria uma contradição. O alcoolismo do marido da Sra. Price, assim como o adultério de Maria Bertram, e ainda a falta de caráter da condescendente Mary, seria para a autora falhas morais graves na família e na sociedade, culpa do modo de ser católico, compassivo e supersticioso. Além de suas virtudes pessoais, Fanny, a heroína da história de Austen é uma felizarda por ter William como irmão, digno de respeito e admiração, seu pai substituto. Igual a Mary, com seu irmão, Henry, que não é, todavia, uma boa pessoa, o que contribui para a diferença entre as duas. Na falta de um pai, ou poder superior confiável, é importante haver quem o substitua, na vida real, como na imaginação. O nome William remete a William Shakespeare, crítico da corte elizabetana, de quem Austen seria leitora assídua, de seu aprendizado literário. Henry, a Henrique XVIII, um personagem shakespeariano, que flerta ao mesmo tempo com Júlia e Maria, a exemplo do tirano inglês que seduziu duas irmãs Ana e Maria Bolena. Já a teimosa Mary (a católica Mary Stuart?) recebe a afeição de Edmund, herdeiro de Mansfield, mas que não lhe dá o devido valor, abrindo espaço para  Fanny. Jane Austen fantasia a realidade política e religiosa da Inglaterra à época.  A autora acredita no poder laico da literatura, da arte, mas seu olhar é nitidamente moralista e religioso.
       
      As mudanças que ocorrem na vida das pessoas, assim como nas sociedades, que evoluem. Ou regridem, como acontece com o país de origem dos imigrantes, que partem da terra natal para melhorar suas vidas, e podem não encontram o paraíso no lugar adotado, como esperam. Os foragidos das nações em guerra, por exemplo, que chegam em grandes levas aos países desenvolvidos e em paz, quando a adoção, ou inclusão, não é assim tão fácil, principalmente quando não se está ali por vontade, mas por força das circunstâncias. Uma questão crucial para quem chega, é preservar a bagagem cultural, ou então assimilar a cultura local. Fora do contexto de uma cultura universal, alguns acabam por se deixarem seduzir pelo radicalismo, pelo terrorismo individual, ou em grupo. A literatura laica pode ajudar. Para que não encontrem inspiração nas células terroristas, do Estado Islâmico, por exemplo, que matam e morrem alegando que agem em nome de Alá. Uma das tendências mais perturbadoras da atualidade é o terrorismo, que teve ascensão abrupta no mundo, e requerer resposta urgente da civilização. O ser humano é naturalmente violento, e o terrorista não é um ser diferente de nós, apenas adotaram a violência como modo de vida, em um mundo que se afasta cada vez mais da paz divina. No romance, Fanny vai ter sucesso ao final por merecimento e certamente ajuda de Deus, é o que se depreende do texto analisado. As demais personagens femininas não se dão muito bem. No mundo atual há os que fazem barulho por nada, que dizem lutar por uma causa, mas não passam de pessoas movidas, menos pela justiça e mais pelo ressentimento. Dizem ser contra o racismo, a homofobia, a discriminação, mas querem é se mostrar, e são o contrário do pregam.
          
          HOJE FAZ QUINZE ANOS QUE OCORREU O ATENTADO TERRORISTA ÀS TORRES GÊMEAS EM NOVA YORK, ONDE MORRERAM MAIS DE DUAS MIL PESSOAS.

Nota: Minha interpretação deve, em parte, a A.S. Byatt e Ignês Sodré autoras do livro IMAGINANDO PERSONAGENS.