terça-feira, 13 de junho de 2017







                         DOIS ÍCONES  DO CINEMA






      Paul Newman e Richard Gere - dois dos maiores ícones do cinema americano - tornaram-se famosos pelo talento e por serem donos dos mais belos olhos de Hollywood, que encantaram e encantam gerações de fãs. Ambos sex symbols, diferente, por exemplo, de Kirk Douglas, hoje com mais de 100 anos, de masculinidade mais agressiva, muito embora a covinha no queixo seja um charme à parte do pai de Michel Douglas. Celebridades que o cinema americana produz da noite para o dia, os grandes mitos da atualidade. Não há gente hoje que impressione mais que os artistas de cinema. Convivemos com essa realidade há um pouco mais de um século, para o bem e para o mal.
        
     Nascido em 1925, com pai negociante de artigos esportistas, Newman, além de artista de cinema  be, sucedido, teria maior paixão pelo automobilismo e sua velocidade, modalidade de esporte em que se destacou, e não é desconhecido sua dedicação à filantropia. Estourou nas telas ao contracenar com Elizabeth Taylor no filme “Gata em Teto de Zinco Quente”. Com a esposa Joan Woodward - por cinquenta anos sua parceira no cinema e na vida real - fez filmes memoráveis. Tornou-se empresário de sucesso, e teria ganho mais dinheiro que no cinema.
     

      De outra geração, Richard Gere, nasceu em 1949, o pai fazendeiro no Estado de Nova York, de onde saiu com bolsa de estudo para cursar filosofia na cidade Nova York. E antes de fazer cinema, apresentou-se em bandas de rock. Protagonista de “Noiva Em Fuga”, contracenando com Julia Robert, neste, como em outros filmes de sucesso. Teve várias casamentos, diga-se, sem escândalo, o que é comum acontecer com as celebridades, poucos escapam. Gere de formação familiar cristã, adotou o budismo, filosofia e não religião.


  
 Os artistas Paul Newman e Richard Gere envolveram-se, pois, com as causas humanitárias.  Richard dedica-se às causas ligadas à paz, aos direitos humanos e dos animais em todo o mundo. Paul, falecido, fez doação para a caridade de todo o dinheiro que ganhou como empresário de sucesso. A fábrica de sonhos que é o cinema pode levar as estrelas a brilharem na tela, também que se envolvam com o que é de maior relevância. Não apenas ter sucesso, mas, como qualquer mortal, sentir necessidade de dar outro sentido à vida. Querer viver, para além do glamour. Fugir da  vaidade, para não se desestruturar, o que pode levar as pessoas a enveredarem por caminhos tortuosos como o do alcool e drogas, hoje presente no meio artístico, a destruir talentos. 




sexta-feira, 9 de junho de 2017



CONTO

À   SOMBRA  DE  JANE AUSTEN II

                  
                           O AMOR ESTÁ NO AR!




A década de 50 foi inesquecível para  quem vivenciou seus dias de juventude na terra do poeta Gonçalves Dias. Dançava-se nos clubes da cidade, compromisso social e diversão garantida para moças e rapazes, que então trocavam apreensivos olhares, furtivo sorriso, até se formarem os pares para a dança, o namoro e até mesmo sair acordo de casamento. Bem diferente dos encontros atuais nas baladas, e o tal "ficar". Todos muito jovens, que voltavam dos bailes com o coração a dançar, o mundo ainda acanhado, mas que se alargava; de uma forma para eles, e de outra diferente para elas. As mulheres recebendo educação formal, ainda que, em sua maioria, se tornassem donas de casa.  Estudantes em maioria, alguns cobiçados cadetes, também bancários, em busca de alguém especial nas festas. O caso de Marcelo, que tinha também o sonho literário, que o levaria um dia à Academia de Letras, e naquela festa junina de 1955 lembra ter confidenciado ao amigo ao lado, que ia pedir a mulher de sua vida para dançar, e assim o fez. Foi amor à primeira vista por Aurora, com seus vivazes olhos castanhos, de quem não mais se separou. Finda a última dança, apressou-se o futuro advogado em dar ciência à moça de suas sérias intenções,  e concluir:
— Dá-me a senhorita garantia de que ficará a espera, até que eu conclua minha formação em direito, daqui a dois anos?
O coração apreensivo do rapaz a imaginar sua eleita desistindo de esperá-lo, e aceitasse outro qualquer, que pedisse sua mão. Um tanto lusitana no falar, Elvira prometeu que ia aguardá-lo, sim:
 — Fico eu cá, e que tu cumpras, também, com a palavra empenhada. Sei que é muito importante os estudos, com o que terás melhoria profissional.
   Três irmãs puderam comemorar juntas a conquista de seus cadetes. Cleide  já estava de par constante com Belarmino, cadete da aeronáutica, enquanto sua irmã, Cristina, não tirava os olhos do cadete da marinha, Fernando, até que ele veio buscá-la para dançar. Enquanto a terceira, e mais velha, de vinte e um anos, Elvira, acabara de casar com um oficial do exército. Um milico  puxando o outro. Já a prima Marilda estava feliz com o herdeiro de uma casa comercial de calçados, que conhecera em festa no ano anterior, e estava no segundo filho, a procriação em alta. 
 Promessas de casamento que aconteciam nos bailes e davam certo. Alarico estava de férias na cidade natal, estudando medicina em Salvador, na melhor  faculdade do país à época, e também onde habitavam as mais belas moças, de descendência espanhola e também de origem africana. E o futuro médico não previu cair na tentação de uma morena cor de jambo, quando começou o namoro com Aline, animado pelo casamento caipira, em que ele fez o papel de noivo. Disse seguro de si:
— Ei de ser o melhor cirurgião da minha cidade.  Vou dar tudo de mim pela profissão, e também para a família que formarei.
Aline escutou Alarico, sem poder imaginar as  infinitas boas surpresas a eles reservadas, ainda que não fossem ficar juntos. Respondeu-lhe:
— Acredito que não vais decepcionar quanto à tua profissão, nem quanto à família. Mas dependemos muito do que o destino nos reserva. Ouvi falar que 90º é pura sorte. 
A roda do destino não parou de girar. 

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Passados os anos, e ainda tinha quem lembrasse daqueles tempos. Inicia Ana uma conversa com sua irmã Inez:
 — É intrigante como os pares se formam, a força primal que impulsiona o homem, enquanto o amor é que enleia a mulher. E se não me falha a memória, houve uma dança das cadeiras, lembra? Alarico casar com Alzira, quando já estava comprometida com Aline, deu o que falar! Uma troca que parecia sem razão de ser, mas é dito popular que “o amor tem razão que a própria razão desconhece”. Faz parte dos nossos maiores anseios amar e ser amado, e não acho justo impor sanções às esperanças de felicidade a um coração cheio de boas intenções. 
— Minha irmã, o dito popular é que "de boas intenções o inferno está cheio”. A pessoa pode acertar em cheio, ou   cometer equívocos, e o pior é querer transformar as pessoas a seu bel prazer. E tem gente fascinada por esse papel.  Verdade, Ana, que há obstáculos à vontade que o caráter e a razão impõem. Acontece que nada mexe mais com as pessoas que os sentimentos. Mesmo que haja os trapalhões, que buscam a felicidade através de um poder qualquer, até do vil metal. A subjetividade então moldada nos termos de oposição entre riqueza e pobreza, dominador e dominado, vigoroso e frágil, vício e virtude.
              — Há quem não escute a voz do coração, ou deixe de seguir os ditames da razão. O orgulho pouco diz da autêntica vontade, e preconceito revela hipocrisia social. E como nós somos preconceituosos, Inez, há preconceito racial, social, cultural, que temos de evitar, ou administrar. O medo de conviver com pessoas que não nos aceitem como somos, não nos compreendam, nem nós a eles. E conviver consigo mesmo, às vezes, não é fácil. Para complicar as coisas, são justamente aqueles que devem mudar seu modo de ser, os que não mudam nunca.
               — Qualquer interesse pede igual contrapartida, assim como uma fortuna sempre está à espreita de outra. Entenda-se que, no casamento, as partes, no fundo, não querem resolver problemas um do outro, seja em que sentido for, o que, a longo prazo, desgasta qualquer relação. Mas fico por aqui, Ana, tenho que ir ao aeroporto buscar meu marido que chega do norte em visita às terras que acaba de herdar, dizem que são terras colocadas para demarcação. Pobre cultura indígena, os primeiros donos da terra, nossos ancestrais, que com os brancos e os negros deram origem a nós brasileiros. 
                                              
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                    Findo o noivado com Alarico, Aline resolveu embarcar no primeiro navio para o Rio. E mesmo com desanimadores auspícios — se considerarmos a falta de crédito em banco — mas com a boa semente, plantada em seu íntimo, saiu da casa paterna em busca de trabalho no sul do país. Os migrantes internos, então recebidos por parentes, amigos, patrões, que haviam chegado antes, e abriam caminho para os demais. Ia trabalhar de dia e estudar à noite foi o que fez a visionária nordestina, que em pouco tempo já estava adaptada. Em uma costumeira conversa com Mário, seu colega na faculdade, veio-lhe à memória o passado na cidade natal:
               — Aconteceu até uma carta com poder para arruinar qualquer reputação, pondo alguém fora da competição, que de algum escândalo ninguém escapa. Necessário manter o ânimo elevado, saber que vale a pena lutar pelo que se quer da vida, sem utilizar artimanhas para satisfação dos caprichos, e ser heroína de uma triste história. Vontade também se educa.  Mas tem gente que se agarra a qualquer tábua de salvação. Os maiores problemas são causados pela ignorância, daí que ela seja erradicada, de uma vez por todas. O egoísmo também faz vítimas. Nós, mulheres, ainda somos vistas como anti-heroínas, por trabalharmos fora de casa. Heroísmos à parte, que absurdo sermos desestimuladas, até mesmo impedidas de estudar e trabalhar, não achas Mário?
               Enquanto Aline falava, o amigo refletia sobre suas palavras. Pertencente a uma família de boa situação financeira, mas numerosa, também precisava trabalhar, e a sorte era viverem um tempo de pleno emprego. Mário também não achava justo a situação feminina, e torcia pelo progresso de homens e mulheres:
               — Se as mulheres não diminuem sua ignorância, a tendência é aumentar a estupidez dos homens. Às fraquezas somam-se os temores. No nosso país, como em todo o mundo, uma velha questão se faz presente, como educar as crianças e conduzir os jovens, para que possam se deliberar na vida adulta.  Hoje as decisões tendo menos influência de fora, tudo a depender da maneira de ser de cada um, das escolhas pessoais, seus medos e ilusões. Não apenas a coragem é que nos faz tomar decisões, mas o aval, que pode vir de fora, como de dentro da pessoa, ou de ambos, quando há isenção de conflitos. Acreditar nos sentimentos, sem deixar de lado a razão.  
                  — Mário, sou fã de Jane Austen, e na ficção, como na vida real, acho que há os protagonistas que acertam em cheio, e aqueles que estão radicalmente equivocados; ora os sentimentos é que são negligenciados, ora a razão. A mulher com o dever de bem cumprir seu papel no lar e na sociedade, assim como o homem. E se promova a igualdade de direitos, sem que intervenções impertinente ameacem destruir homens e mulheres na sua essência. Só estranhei ser recebida como intrusa no meu primeiro emprego, o que me pareceu falta de educação profissional daquelas pessoas, no mínimo, indelicadeza.  Afinal, tinha que trabalhar para custear meus estudos.           
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            Início de junho, as festas juninas estavam a todo vapor, e Cibele ia de um compromisso a outro, e, sem razão aparente, começou a pensar no irmão Alarico, que havia casado com a baiana Alzira e não com com Aline, quando parecia feitos um para o outro. Uma trama do destino? De longe, avista dentro da livraria alguém que conhecia. Num impulso entra, passa rápido pela pirâmide de best-sellers colocada estrategicamente na entrada, sempre alguma publicação em destaque. Era Aline que pesquisava na estante os livros. Foi ao seu encontro:
— Olá, Aline! Quanto tempo! Que boa surpresa te ver! Soube da tua volta à terra natal, quero te dar boas vindas. Já deves estar informada de tudo que acontece por aqui, de bodas e batizados. Não casei, o tempo foi passando sem que algo acontecesse nesse sentido. Tem gente que me chama de macumbeira, eu nem ligo, até acho boa promoção. A mística é ciência para mim, uma primitiva ciência, que não deve ser relegada, o que penso. Há pouco cheguei dos Estados Unidos, onde passei uma boa temporada com a tribo Sioux, em Dakota, nos Estados Unidos, e aprendi no xamanismo a técnica de ativar os chacras ao que me dedico. Mas o que me importa é  estar livre do poder dominante, inclusive de um marido.
As lembranças de Aline foram despertadas:
— O quanto a vida nos surpreende e ensina, Cibele. Sou da ciência, sem fugir da essência, me dedico a escrever, ainda pretendo este ano vou publicar um livro. A cultura é de importância capital, e quero contribuir de alguma forma, as pessoas, hoje, tão confusa diante da vida. Uma imensa população como a nossa, a maioria precisando do Estado para saúde e educação. Estou matando a saudade desta livraria onde adquiri meus primeiros livros, romances de Jane Austen.
Na estante de literatura. Abriu uma coletânea da sua autora preferida, e leu uma passagem de Orgulho e Preconceito em que uma das irmãs mais novas da família Bennet tem comportamento de uma sem noção, igual à mãe, enquanto as duas mais velhas, Jane e Elizabeth, ao longo do texto, demonstram bom senso e agem da mesma forma. Passa uma vista em Mansfield Park, com a protagonista, Fanny, alter ego da romancista, supostamente ranzinza e inadequada ao novo lar na casa dos tios ricos, e que se depara com um quarteto de primos sagazes e sedutores, mas pobres de espírito. Cibele aproxima-se:
— Não sou leitora dos velhos romances, nem dos novos, não tenho interesse. Se é para ler prefiro saber da vida real através dos jornais na televisão e nas redes sociais, mesmo que me irritem, me cansem.
— Cibele, não conheço estado de civilização sem o costume da leitura. É a mais avançada e madura fase da vida humana. Sou leitora assídua e pesquiso em todos os ramos do conhecimento para escrever os meus livros . Cientificamente o que se sabe é que há uma chama interior, que pode  aquecer a pessoa, ou queimar suas entranhas. Freud explica que a repressão sexual é a causa do histerismo, o que não é a única, lógico. Quanto à vida afetiva, se não é bem encaminhada pode desencadear algumas doenças, e o certo é que os bons sentimentos elevam a um patamar ideal de vida. Penso que não há poder mais dominante que o sexo, sendo assim, é preciso educar os desejos, represar os instintos, evitar abrir certas comportas, saber das nossas limitações. Felizmente não param as pesquisas científicas para a cura dos males que nos afligem física e espiritualmente. Sem desprezar o poder da fé em Deus. Para ser feliz é necessário preservar a saúde física e, em especial, a saúde da alma.  
              
            Depois de folhear mais alguns livros, Aline voltou à cafeteria para despedir-se de Cibele, que ainda lia as notícias no jornal do dia. Saiu a pensar que as pessoas entram e saem de nossas vidas, mas ficam as essenciais. Pelo caminho até a casa continuou elucubrando, que tudo começa com a magia, que não tem compromisso com a verdade, mas pode ir além daqueles momentos de euforia. E a diferença entre dançar e casar, por exemplo, é o tempo de duração da fidelidade. E se nada der certo, daquilo que se quer? O pior é morrer sem entender o que significa ser feliz de verdade. No passado as moças, após os bailes, mantinham a alma em festa, até o próximo encontro, que poderia ser mais duradouro, mais sério, e que fosse para a vida toda. Mulheres exemplares, que lutaram pela vida, sem serem feministas, ou não sabiam que eram. Andava Aline tão distraída em seus pensamentos que quase entra por engano no apartamento vizinho. Ao entrar na casa certa, foi direto para o computador, ia aproveitar que o marido ainda não havia chegado do consultório e passou a trabalhar em seu texto. Aline perdeu um ginecologista, mas  casou com um psiquiatra. E foi com seu marido que aprendeu a treinar a mente para afastar o ódio, a mágoa. E por sua fé católica cultiva o espírito, ciente de que, na plenitude dos bons sentimentos, se é mais feliz. 


A DANÇA DAS CADEIRAS

FELIZ DIA DOS NAMORADOS!