GALERIA VERMEER

terça-feira, 7 de maio de 2024

 


FICÇÃO

 

                                                               





                                                           
IDADE E TEMPO 



                         Elas começam a chegar para o almoço em comemoração dos 6o anos da mais nova entre as cinco amigas ali presentes, que dão início à nova fase da suas vidas, a velhice, como consta no cartão de estacionamento gratuito, uma vantagem da idade. Na realidade mulheres maduras e cheias de vida. Depois dos calorosos cumprimentos e entrega dos presentes à Mriana, sentam-se para a festiva refeição.  O costume é reunirem-se mensalmente em uma cafeteria, e sempre há um assunto  em palta para o debate.  Hoje estão no restaurante escolhido pela aniversariante, e  o assunto em palta éjustamente a velhice, da qual todas agora fazem parte pela idade. 

     Início de primavera, e Maria declara seu encantamento pela “estação rósea”, ou  das flores. “Coisa da velhice a cor rosa”,  diz Alice a sorrir, com a blusa na mesma cor. A aniversariante veste azul, sua cor preferida, e já distribuiu as fatias do bolo após apagar as velinhas do "parabéns". Alice está com sua fatia nas mãos, comenta:

      — O clima do planeta está mesmo alterado, com um calor intenso, o maior de todos os tempos, e as castástrofes acontecendo, como essa enchente no Rio Grande do Sul.  Nós aqui dando grças a Deus de sofrermos apenas pela conta da energia, que está nas alturas, com o ar refrigerado ligado sem parar, numa casa de cinco pessoas, em três faixas de idade.

     Os pais moram com ela, ou ela é quem mora com os pais, depois da separação,  em companhia das duas filhas. Já Cibele é solteira, mora sozinha, e inicia sua fala sobre o que foi programado para aquele encontro:  

      — Adentramos na velhice, mas na verdade eu ainda me sinto em plena mocidade, com boa saúde, do que sempre cuidei, e já tomei minhas providências para ganhar musculatura,   a maior protetora dos ossos, que se perde com a idade.

      Maria já se manifestou, mas não esquece o Show da Madona em Copacabana, que viu pela TV na noite anterior e, aproveita para  a partir daí entrar no assunto da velhice:

       – Vocês viram na TV o show da Madona?  Acredito que nenhuma de nós esteve lá, ao lado daquela moçada enlouquecida. Dizem que houve até resgate no mar de fãs da cantora.  Mais de um milhão a gritarem sua paixão pela artista pop. E eu aqui com saudade de mim mesma, quando escutava no rádio Dalva de Oliveira, e meu maior sonho era ganhar uma bicicleta, mais tarde casar e ter filhos. Hoje os jovens só pensam em ser uma pessoa intensa. Mas acho que a intensidade dessa gente em vez de preencher a vida, sufoca.

         Rosália  confirma que viu a transmissão do espetáculo:

      —Vi uma mulher a se superar nos excessos de uma apresentação  satânica. Madona mente ao se dizer cristã.  Ela não é mais jovem, como são seus filhos, que a acompanharam na excursão ao Brasil, e fizeram loucuras no palco ao lado  de Anita e Pablo Vittar, entre outras jovens “celebridades”.  Felizmente a mocidade não é só isso, tem gente ainda boa da cabeça.

      O show de Madona torna-se um gancho para falarem da velhice, o que Rosália tenta abordar  em poucas palavras:

      — Certo que envelhecemos por fora, mas por dentro estamos vívidas, plenos de vida, basta que se queira e esteja preparado. Já esses moços de hoje, fãs de Madona e outros popstars, parecem desgostosos do mundo em que vivem, e tem até os que querem a todo custo por fogo em tudo. Gente que se diz intensa, mas é certo que se o vigor e a vontade forem disperdissados  faz a alma envelhecer.  Enquanto os de alma elevada se mantêm em boa forma, de acordo com sua idade. 

      Mas a catástrofe que deixou o Rio Grande do Sul debaixo d`àgua, e sua população ao desabrigo, merece toda a solidariedade. Maria está aflita, e pergunta: 

     — Castigos  para os homens, em resposta aos seus desmandos? Chuvas torrenciais no Sul, e  uma tórrida Madona, que parece ter surgido do fogo do inferno.  A cantora já foi embora, resta esperar essa outra tempestade passar o mais rápido.

      Rosália vai fazer 70 anos no próximo mês, e diz sempre que procura manter intacto seu amor pela vida, que ela acredita merecer toda atenção dela, volta a falar:

     — Os idosos podem não ter mais aquele antigo vigor, aquela veemência, nem mesmo aquela antiga vontade, mas podem ganhar dos jovens em  discernimento, o que lhe promove a experiência, e a ter uma vida melhor. Tempo de vida após a mocidade, a velhice é para ser vivida sem arroubos. ou assombros. Mesmo que haja velhos ridículos, que querem ser jovens. E arrastar uma velhice vazia é o que há de pior. Tem os frutos da vitalidade, e os frutos de uma vida bem vivida, na fortaleza espiritual, que pereniza a juventude da alma. A mediocridade é que faz a pessoa engolir uma Madona, por exemplo.  

      Duas horas se passaram, e elas ficam um tempinho caladas, até se despedirem.

 

 

 

 

 

 


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