CONTO
VITAMINA E AFETO NA REFEIÇÃO
— Sinto
muito, Maria. Eu devia ter pensado melhor sobre tua situação, ser mais solidária e
ajudado mais. Sinto muitíssimo!
— Ainda
bem que não te ocorreu nada disso. Eu tinha que aprender a suportar com coragem aqueles momentos difíceis. Não estava doente nem nada, era
só enfrentar a separação com a cabeça erguida, daí me afastei um pouco para
assimilar melhor a situação. Mas de todo jeito já passou. Você também, Ester,
passou por um momento difícil no trabalho, o que eu soube, e se saiu muito bem.
Felizmente você tem o Paulo para sua segurança. Agora é seguirmos em frente com a
vida e nossa amizade.
Maria
afastou-se um pouco, foi até a janela, era a mais velha, sentia algo de novo em suas vidas, estiverem as duas algum tempo
afastadas, voltavam a se ver. Observou o céu de Brasília, que coloria de forma especial a cidade, banhada por uma breve chuva de fim
de verão. Esperava a filha chegar para o encontro de fim de tarde na casa da
mãe. Nívea só podia comparecer às quintas-feiras. Escutou a irmã chamar:
-- Maria,
venha para a mesa, como você sabe é hora da famosa sopa. A mãe já colocou a sopeira na mesa e está sentada com o pai à espera dos filhos, ansiosa para ver todos
juntos.
— Zeca
ainda não chegou? Ele com a mulher e as gêmeas já deviam ter chegado, não?
Chega o irmão do meio, antes havia passado na confeitaria, trás pães, bolos e docinhos, como sempre faz para agradar a família. Colocou as compras sobre a mesa e comunicou que a mulher e as filhas iam demorar
um pouco. Pegou o prato para se servir.
As
sopas dos fins de semana na casa a mãe eram receitas da avó, vindo de geração a
geração, tendo o aipo como ingrediente indispensável, sem faltar o tempero principal, o amor. Vitamina e afeto na refeição do fim do dia, a
família reunida, quando todos aproveitando para trocar ideias, abordar os
assuntos do momento. Evitavam falar de política, e também da vida alheia, como
se fossem neutros nesses assuntos. Nívea acabara de chegar e já estava
saboreando sua porção de alimento e afeto.
Ester
olha para o centro da mesa e diz:
— A
sopeira da mamãe fez-me lembrar o caldeirão da bruxa das
histórias vindas da Idade Média. Pode começar a falar, mãe, já que é expert no
assunto comida e bruxaria.
Dona
Diva, a mãe, não se fez de rogada:
— Parece que os
filhos adivinham o que os pais pensam, e vice-versa. É isso aí,
estamos sentados em volta de uma sopeira de porcelana, se fosse no passado
seria um caldeirão de ferro, e tem o caldeirão da bruxa. Essa sopeira não tem mistério algum, apenas contém uma mistura de ingredientes, que
faz o alimento ser tão saboroso e por
demais substancioso. Não há bruxaria, nem magia, que possa competir com o poder
dos produtos frescos e saudáveis, com as
vitaminas certas para alimentar o corpo. Ainda mais feitos com dedicação e amor, que alimentam
a alma, assim com o afeto entre os
aqui presentes.
A mulher e as filhas menores do Zeca tinham acabado de chegar. Depois que se serviram, os outros voltaram a repetir
mais uma porção da sopa, e suprir ainda mais a alma do afeto da família.
Os doces muito apreciados, Maria agradecendo a atenção do irmão, que costumava percorrer
os vários locais onde pudesse encontrar novidade, para surpreender os familiares.
Falar
em eternidade é dizer das sopas de dona Diva, servidas com carinho e amor na
Ceia em sua casa.