sexta-feira, 18 de agosto de 2023

 

 DUAS POESIAS DE WISLAVA SZYMBORSKA

             



 PORTA DA PEDRA

 Bato à porta da pedra.

—Sou eu, me deixa entrar.

Não busco em ti refúgio eterno.

Não sou infeliz.

Não sou uma sem-teto.

O meu mundo merece retorno.

Entro e saiu de mãos vazias.

E para provar que de fato estive presente,

não apresentarei senão palavras,

a que ninguém dará crédito.

 

Bato à porta da pedra.

—Sou eu, me deixa entrar.

Não posso esperar dois mil séculos

Para estar sob teu teto.

 

—Se não me acreditas—diz a pedra—

fala com a folha, ela dirá o mesmo que eu.

Como a gota d`água, ela dirá o mesmo que a folha.

Por fim pergunta ao cabelo da tua própria cabeça.

O riso se expande em mim, o riso, um riso enorme.

 

Bato à porta da pedra.

—Sou eu, me deixa entrar.

 

—Não tenho porta —diz a pedra.

 


ABC

Jamais saberei

o que A pensa de mim.

Se B acabou por me perdoar. 

Por que razão fingia C que tudo estava bem.

Qual a quota-parte de D no silêncio de E. 

O que espera F se acaso algo esperava.

Por que fingia G sabendo de tudo.

O que tinha H a esconder.

O que queria I acrescentar.

Se o fato de eu estar perto

teve algum significado

para J e K e para o resto do alfabeto.


E mais um pouco de Wislawa

.......

"Me desculpe tudo, por não estar em toda parte. 

Me desculpem todos por não saber de cada um e cada uma.

Não me julguem má por tomar emprestado palavras patéticas

e depois me esforçar para fazê-las parecer leves."


......


 Nota; W.S. nasceu na Polônia em1923. Em 1931 mudou-se com a família para a Croácia de onde não mais saiu. Em 1996 ganhou o Nobel de Literatura. Faleceu em 20 12.


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