sábado, 21 de agosto de 2021

 


                  QUARTETO DE MENTES AFINADAS










                As irmã Marta e Maria eram amigas de infância de Jovita e Rosália, ficaram algum tempo afastadas, até que voltaram a se ver e desde então passam juntas as tardes da última quinta-feira de cada mês.  Casadas e com filhos de todas as idades, nesses encontros falam sobre suas vidas como profissionais, além de comentarem os problemas da atualidade. Elas ali livres e leves, não soltas. Mulheres não mais dedicadas unicamente aos afazeres domésticos, quando então só conversavam sobre crianças e criadas, era o que diziam delas, apelidadas de cri-cris. As empregadas domésticas tornaram-se raridade, as  refeições prontas para serem descongeladas no micro ondas, e ainda havia o serviço delivery dos restaurantes. E as crianças,  em menor quantidade, indo para as creches, e os maiores, assíduos nas atividades extra curriculares, com aulas disso e daquilo. Todos com os celulares na mão, conectados via internet. 

            Dia 8 de março, dedicado à mulher, a historiadora e filósofa Marta dá início à conversa:

          —Nada é tão simples, há uma complexidade de tudo que existe e desafia nossa mente racional. O cérebro humano desenvolvido para pensar e agir diferente dos outros animais. E o que ganhamos e perdemos de ser como somos? 

           A assistente social Maria responde de pronto:

         — Almejamos a imortalidade, como se fôssemos deuses, mas nos deparamos com limitações e a morte. Nossa alma transcendente, libertária, pertence a um corpo que tem limitações. Um paradoxo sermos sensíveis e amorosos,  também insensíveis e cruéis. Portanto, o que somos mesmo é merecedores de compaixão.

          Apressa-se a dona de casa Jovita a falar da compaixão, sua palavra predileta:

       —Você falou em compaixão, Maria, e  quão  importante é desenvolvermos esse sentimento de real importância para nossas vidas. A compaixão pouco abordado na filosofia, seu conceito de humanidade a envolver o outro. 

            Rosália toma a palavra:

         - Nessa jornada sobre a terra é importante ter o espírito fortalecido,  além de manter o corpo ágil. E se devemos fazer alongamento, como aconselham os  personal trainers, mais importante ainda é exercitar a mente. Entender quem somos e dar atenção ao que fazemos. Sem esquecer de atender ao chamado do alto.

         Marta tinha dificuldade em sair da cama para enfrentar o dia, mas contava com a ajuda do marido, o que já havia confessado às amigas. Com mil atividade, às vezes, sentia-se exausta. Dessa feita declara: 

          — Lutar com afinco pela realização pessoal, como faz meu marido é de se valorizar, mas saber que o sucesso e o fracasso não mostram quem somos. Não aceitar de pronto um papel qualquer que lhe é dado. Desenvolver os talentos, abraçar o conhecimento, valorizar o trabalho, sem se preocupar em atender às expectativas dos outros.

            Maria completa:

          — Prêmios, riqueza materiais, e tudo o mais, não sintetizam o nosso ser verdadeiro. A sobrecarga que pode advir do trabalho árduo, e que se dê espaço à leveza das horas, aos sentimentos, aos afetos. Mas como vivenciar tudo isso nesse mudo tumultuado em que vivemos?

        Rosália é assessora parlamentar e acaba de receber uma mensagem no seu celular sobre a tomada de Cabul pelo movimento revolucionário Talibã. Depois de um um grave silêncio, os comentários naquela mesa, antes tão descontraída e feliz, passam a versar sobre a situação no distante Afeganistão, que  mexia com o mundo todo. O retrocesso que ia acontecer naquele país quanto às questões femininas, as mulheres mandadas de volta para casa e obrigadas a usar burca conforme as leis do Islã.  

         A jovial Jovita encerra a conversa:

      - O quanto é importante aqui no Ocidente mantermos viva nossa fé cristã e  nunca perdermos a esperança!

 

    


 







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