DE AMOR E PAIXÃO
— Quem
somos nós para afirmar o que é e o que não é uma boa vida.
Palavras
ditas por uma parenta a Maria, que de imediato pensou na mãe e sua
afirmação de que a pior vida era melhor que vida nenhuma, ou a morte. E no entendimento
de quem fora a mãe, e ela própria décadas atrás, quando não
havia como querer outra vida senão casar e em contrapartida ter uma casa com
marido e filhos para cuidar. O homem com seu próprio planejamento a cumprir, conquanto seu destino fosse encontrar sua companheira em algum ponto do caminho.
Pena que a avó de Maria nunca tenha obtido o perdão da filha, desde que posicionou-se contra sua paixão e casamento. Não há como julgar pessoas que legaram grandes ensinamentos aos descendentes. Tem gente que goza da paixão pelo dinheiro e por tudo o que ele propicia. As mais sábias preferem viver de outra forma, sem essa questão de querer boa vida, ou ser feliz a qualquer custo. Depois de uma conversa nesse sentido Maria aos quinze anos recebeu um ultimato de Mário nos seus dezoito, que antes de partir para estudar fora, despediu-se com um olhar, mais de compaixão que de paixão, e as míseras palavras:
— Temos
um longo caminho a percorrer. Que eu possa mais adiante alcançar você, e
você a mim. Não nos percamos de vista.
Maria deixou a vida fluir, cientes que qualquer caminho não ia servir para ela chegar a autossuficiência e vida plena, sua pretensão. Logo percebeu que o universo está pronto para cuidar das pessoas que sabem para onde quer ir. Importa ter meta a cumprir, sem deixar de dar espaço para as surpresas. Ter cuidado, que há as boas surpresas e as ruins.
Por descuido Maria havia perdido a oportunidade de um bom emprego, mas não ia perder a esperança, sempre viva dentro dela. Simplesmente recomeçava, no que ia se tornar mestra. Até alcançar a maturidade, inclusive, no amor. Maria agora observava sua própria vida, e a vida em sua volta, e verificou o quanto uma paixão pode ser decepcionante a longo prazo. Certo que a vida pede atenção, cuidado, e que se desconfie dos aplausos e julgamentos apaixonados.
Ano de 2022, da Copa de futebol no Catar, e lá está o antigo casal, desfrutando o feliz reencontro de décadas atrás, e como todo o Brasil na torcida pela seleção de Tite. Sobre a paixão do torcedor pelo futebol o neurologista Conrad Estol aponta para as emoções despertadas pelo fanático ao assistir um jogo, que se semelham a "um coquetel de condutas anormais" no qual se mistura a paixão, similar a de Cristo que compreende a aceitação e sofrimento como essenciais à vida. Maria, todavia, pensa na diferença entre a sensação vinda do instinto de competição, primitivo, o caso do futebol, enquanto nos eleva a nível de compaixão a outra sensação, ambas necessária para o equilíbrio das emoções.
Diferente da paixão do futebol, a paixão de Cristo serve para despertar a compaixão, que se segue à sua paixão.
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