MEMÓRIA
O POVO FELIZ NA RUA GRANDE EM S. LUÍS - MA |
Palavras
esquecidas pelo tempo chegam de repente á lembrança. Falas familiares
ditas um dia, sentenças com alguma erudição, o que sobrou do passado. E aquele
significativa metáfora como a cereja do bolo da memória.
A eternidade na memória, e um dia Maria vai querer contar sua história com palavras cativantes, e de forma comovente. Ou seria melhor não dizer coisa alguma? Aguardar que na hora da morte as pessoas falem só coisas boas sobre ela, como o padre no velório do pai, que falou sobre o homem honesto e trabalhador, que nunca havia feito mal a ninguém, e estava certo.
O pai de Maria nunca quis alcançar as coisas na marra. Só exigia respeito, o que nunca lhe faltou. Companheiro de uma excelente mulher, a melhor das pessoas, não só para o marido. Sorte dele e nossa por essa mãe, que viveu até não poder mais, plena de amor pela vida. Confortava os filhos que moravam longe, com suas longas cartas, sábias palavras, escritas com uma letra caprichada, de professora, de mestra. Aos demais prestava a devida atenção.
Os
preciosos cadernos pautados de Maria candidata ao exame de admissão, continham
farto número de problemas de matemática, assim como dissertações e composições. E tinha ainda um
caderno de capa dura com as letras de música, que nada tinham a ver com a
jovem, mas eram palavras, e com elas se encantava: “coqueiro velho abatido pelo
vento, ninguém sabe os desenganos dessas folhas abatidas pelo vento”...
“Olha
a lua, Maria, veja como está cheia d`água”, o aviso poético da
tia, sinal de chuva.
Anos 40, o trem parado no fim do mundo apita que vai partir, e lá longe vem uma mulher
atravessando o areal com compras na mão, pela janela as crianças gritam para ela
apressar o passo: “Mais depressa, mamãe.”
No filme Marcelino
está compadecido do Cristo na Cruz, e fala: ”Você tem cara de fome.” Um adorável menininho que vive no convento com os frades, seus bons amigos. As palavras que ele
diz ao crucificado reflete a mais triste consequência do abandono, que é a fome, entendida
não apenas pela falta de comida no prato, que castiga no corpo. Fome de amor, que dói na alma.
Ser feliz é uma espécie de vocação pessoal, até mesmo predestinação. Tem gente que ama a vida, mesmo em dificuldade. Pode fazer parte da genética essa inclinação, essa índole, quando há pessoas simplesmente felizes, enquanto seja difícil para outras, que estão sempre descontentes com tudo, mesmo que consigam o que querem, ou justamente por isso mesmo. O sentimento de pertencimento, de bem estar, desde o berço - o que o amor promove e faz feliz.
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