CONTO
ROUBO NA COBERTURA
MARIA VILMA MUNIZ
Hermínia já estava perto de casa, resolveu retornar para ficar um pouco mais olhando as vitrines na av. N.S. de Copacabana, bem melhor iluminada e com menos movimento de gente e carros. Perscrutou o céu, não queria ser surpreendida com a chuva, comum naquela época do ano, o tempo meio suspeito. Sentiu alguém bem perto de si, ficou apreensiva, e voltou-se, viu que era o Paulo. Ele então falou com ar de inocência:
— Oi, prima, assustei você?
—Claro, quase podia senti-lo roçando minhas
costas.
—Distraída andando por aí, não tem
medo? Parece que você ficou espantada quando viu que era eu. Seu primo é apenas
um pobre desempregado, mas não morde.
—Bobagem!...
—Você está certa em ficar desconfiada, hoje
em dia o inimigo está à espreita em cada
esquina. Todo cuidado é pouco, tem muita gente ruim por aí, é bom não dar
moleza, não se iludir com as pessoas. Penso nas joias roubadas da sua irmã, um
crime que parece sem solução.
—Realmente há muito o que temer, infelizmente.
Agora estou desconfiada de você, Ricardo, já que mora em S. Paulo, e eu não
soube que estava por aqui. KKKKK. Aquelas joias Estela mereceu tê-las, o muito que batalhou ao lado do
marido. O roubo aconteceu pouco antes da separação. Foi ele quem deu parte à polícia.
—Estava indo para sua casa, visitar os
tios e ver você, lógico. Ainda não tive oportunidade de falar com Estela. Não avisei, porque gosto de fazer surpresa.
—Veja como somos diferentes, eu odeio
surpresas, e ser surpreendida desse jeito só tenho a dizer que me sinto incomodada.
— Perdão, e já que pretende ficar mais tempo na rua, vamos até o MCcafé aqui perto e conversar um pouco. Outro dia tive um sonho com
sua mãe, ela me pareceu aflita. Soube pouco depois do roubo das joias, e que não
há pista do ladrão. Mas vão-se os anéis e fiquem os dedos, já dizia
nossa avó Josefina.
— As joias estavam dentro de uma frasqueira, que ela havia guardado no closet da cobertura antes de separar do Raul. A polícia não
encontrou evidências que pudessem incriminar o encanador que veio consertar a torneira do banheiro da suite, um senhor de meia idade,
que não tem pinta de ladrão.
Enquanto caminhavam ele pensou: “Será
que ela não se perturba, por não conseguir imaginar o quanto a situação é constrangedora para todos?”. Fez uma parada um pouco brusca e falou:
— Você não está interessada em saber
quem foi que o ladrão?
— Não fui eu nem você, certo? Uma casa
como a nossa onde andam parentes, agregados, visitas, tanta gente que vem e via.
Tinham chegado ao destino e já sentados
e os pedidos feitos à atendente, continuaram a mesma conversa. Ele falou:
— Ninguém pode afirmar nada, mas todos
que andam, ou andaram por lá são suspeitos. Mas acho que o mistério do roubo jamais vai ser descoberto. Um crime perfeito? Como descobrir o
autor quando a vítima parece esconder alguma coisa. A polícia sem
ter com que trabalhar, já que a interessada
não fala tudo o que sabe.
— Nós temos mais condição que a polícia
de descobrir. É falar agora ou calar para sempre. O que você acha?
— Tenho cá minhas desconfianças, mas
não quero ser injusto com ninguém. Acusar um inocente não é coisa que se faça.
—Dê seu palpite. De minha parte prefiro não especular nada. Detesto
esse assunto.
— Enquanto isso, somos todos suspeitos.
Eu mesmo andei por lá na ocasião.
— Como o crime pode atingir algum de
nós, seria bom que o ladrão tivesse consciência e confessasse tudo. Passamos a desconfiar
uns dos outros. Tem o caso da prima Cecília que visitou Estela no dia que as
joias sumiram...
— Imaginação sua!
— Enquanto eu imagino coisas, você não
imagina nada, não sei se lhe dou os parabéns, ou lastimo sua atitude. Também
não adiante muito especular, só vale ter certeza.
—O certo é que roubar a própria família
não é tão impossível de acontecer. Aonde você está hospedado?
Paulo prometeu a Hermínia aparecer em sua casa no dia seguinte. Falou que estava
com amigos no Grajaú. Despediram-se.
Pasmem leitores, o ladrão não poderia aparecer, isso porque não houve roubo algum. Ester tinha motivo para não dar maiores esclarecimentos aos policiais nem a ninguém, sobre o roubo de suas joias. Não houve roubo algum, sua dona para não ter que dividir os valores com o ex marido guardou em segredo as peças na Caixa Econômica.
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