FICÇÃO
MUDANÇA DO TEMPO
— Tenho pensado sobre nossa geração, ter sido tão
sem graça, se comparada com a atual. Éramos moças e rapazes, em grande parte,
educados por padres e feiras. A igreja ainda com grande influência na moral a
ser respeitada, mesmo que houvesse quebras de regra, pois sempre há os mais ousados.
É a dinâmica da vida. E vocês o que dizem sobre isso?
Maria
dava início á conversa no encontro daquele dia com três amigas,
confortavelmente sentadas no sofá da casa de Alice, degustando os docinhos
ofertados pela anfitriã. Cada dia era na casa de uma, quando não iam à
cafeteria. Há dois anos tinham parado com os encontros devido à pandemia do
corona vírus. Quem respondeu foi Mariana:
— Dizem
que a mocidade dos anos 50 e um pouco mais, era reprimida, mas acredito que ninguém,
ou apenas alguns tenham sofrido com isso. Não havia esse apelo à liberdade, ao
prazer, aos excessos de hoje. Nos nossos verdes anos o homem e a mulher tinham
o ideal maior de constituir uma boa, ou santa, família. Só o marido trabalhava
fora enquanto a esposa cuidava da casa e educação dos filhos. Apelidadas de “cri-cri”,
ou seja, criada e crianças, sobre o que elas mais conversavam, afinal eram mães
de uma numerosa prole, não apenas de um ou dois filhos, máximo três, ou nenhum,
como hoje.
Alice
deu seu aparte:
— A
felicidade estava em cada um cumprir suas obrigações, o homem com chefe de
família trabalhava fora e a mulher dando duro em casa. O bom conceito almejado, ou seja, ser
bem aceito, numa escala social, do mais rico ao mais pobre. Trabalho não
faltava, todos orgulhosos do seu ofício. Não havia miséria, o que acontece
hoje, mesmo com nosso mundo progressista. Muitos diplomados, sem o devido
conhecimento para o bom exercício da
função.
—
Amo o progresso atual — voltou Marina a falar — mas reconheço as agruras desse novo
tempo transformador, em quase pesadelo. A causa pode ser colocada na conta dos
excessos, sim. Sobra riqueza para uns poucos, enquanto falta quase tudo para a
maioria. A fome que grassa no mundo é um absurdo. No momento lutamos para sair
de uma pandemia, que já dura mais de dois anos. Como se não bastasse, anuncia-se
a volta da varíola, já erradicada. Diante da notícia alarmante alguém teria
dito que nunca imaginou estar tão perto do fim do mundo.
Maria
volta à sala depois de recolher as xícaras do café. Vinha com o licor para completar o café. Apressou-se em dizer:
— A
OMS tratou de tranquilizar a população mundial, e anuncia que há vacina e
remédio para a nova varíola. Ainda bem. A ciência nos salva, essa nossa
capacidade mental salvadora, que segue na cola da destruidora. Avançamos sobre
as matas e os vírus tornaram-se nossos vizinhos. Trancar as portas não adianta.
Tem que respeitar o espaço de cada ser
vivente no planeta, que não é só nosso.
Todas
de acordo. E passaram a trataram do excesso de frio em Brasília, de até menos de dois
graus em pleno outono. Temperatura mais baixa de toda a história da cidade. Por conta disso também estavam reunidas para os agasalhos doados aos pobres, três sacolas cheias que iam levar à igreja mais próxima. Após vestirem os casacos saíram para cumprir a nobre missão.
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