quarta-feira, 15 de setembro de 2021

 



                             ANTIGOS PERSONAGENS

                                      DAS RUAS DE S. LUÍS

 

ANTIGA PRAÇA JOÃO LISBOA



 

                        Imagino se o mesmo acontecia em todo lugar, como em S. Luís, onde havia certos tipos, com características que beirava a insanidade, a perambularem pelas ruas da cidade, o povo a gritar seus apelidos, que ninguém sabe quem os colocou, nem quando, a invencionice era grande. Daquela época, não tem como esquecer  “Bota-Pra-Muê”, de longe  o “doido” mais famoso da ilha, assíduo frequentador da Praça João Lisboa, onde causava admiração por ler o jornal de cabeça para baixo, entre outras artimanhas com que chamava a atenção. Saía dali, e lá se ia ele praguejando contra os xingadores de plantão. 

                     Alguma explicação havia para os títulos pejorativos com que essas figuras da cidade eram tratadas.  Causavam estranhamento, lógico, sem que alguém tomasse a iniciativa de conversar com eles, saber de suas dores, se precisavam de alguma coisa, até ajuda médica e espiritual. EM era um casal de porte miúdo, ambos magrinhos,  o passo miúdo e bem devagar. Talvez fossem irmãos, sós no mundo, e simplesmente saíam de casa para passear.  Eles não revidavam à alcunha, o que era também de estranhar. 

                    Certamente pessoas frágeis, abandonadas à própria sorte, sem meios de se manterem, o que leva à fome e perda do juízo. "Casaca-Curta”, como o nome indica, portava uma casava pequena para seu porte, que pelas ruas cantava um hino de igreja: “Os anjos todos os anjos louvem a Deus para sempre Amem.” Até que parava no meio da cantoria, para revidar ao ritmo da música: “Casaca curta é o c* da mãe...” 

            Parece que “Rodó” e a “Mulher-do-Cachorro eram a mesma pessoa. Sempre muito enfeitada, às vezes carregava no colo seu animal de estimação, como se fosse um filho. Com sua possível morte, ela tentou emprego nas casas, e minha avó, que pouco saía de casa, sem conhecer a pessoa, na falta da secretária do lar naquele dia, deixa a estranha criatura entrar para lhe fazer o serviço de urgência. Nada foi feito, e na hora do almoço a contratada de emergência se recusa a comer dizendo zangada: “Não como comida de branco”. E ela tinha a pele clara. Pesarosa, minha mãe Carmen entende o problema da mulher, e aguarda alguém chegar para despedir amigavelmente a criatura.

                    “Pato” costumava dormir em um banco da Praça da Alegria. Certa noite meu tio-avô sai para procurar uma farmácia aberta e comprar remédio contra febre de um neto que morava com ele. Ao voltar encontra o hóspede noturno do logradouro perto de sua casa, já em preparativos para sua noite de sono debaixo do céu estrelado de uma noite amena de verão nordestino. Não queria parar, mas fica  surpreso quando Pato, ao vê-lo, declara alegremente: “Minha vida é bela, minha vida é uma rosa!” Resolveu sentar-se para apreciar um pouco o silêncio e a beleza daquela linda noite de céu estrelado. Ainda não existia criminosos tocando fogo nos moradores de rua. 

              Não faltavam aqueles que se diziam “Napoleão- Bonaparte. Uma fixação no audaz conquistador francês, por algum tempo vitorioso, conquanto de triste fim. Doidos de rua com mania de grandeza. Queriam ser grandes, conhecidos, aclamados, o que acaba por acontecer de forma por demais tosca.   Minha terra de tantos “doidos” de rua pode ter acontecido por seu passado de glórias, que acabou por receber seu próprio apelido: “A terra do já teve, hoje não tem.” Acabo por imaginar essas pessoas vindas de famílias abastadas, que empobreceram, e seus descendentes, cheios de brio, mas sem ânimo para lutar, coitados. Vítimas do abandono e da pobreza perdiam o juízo. 

 


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