A OLARIA DE SEU TOMÁS
Os filhos
gêmeos de dona Catarina viam com curiosidade as ruínas de algumas casas
abandonadas na cidade em que residiam, com mais de quatrocentos anos. Mas aquela
casa do sonho do irmão mais velho, apenas minutos do outro, era diferente, uma
espécie de cabana misteriosa, coberta de palha, uma voz a lhe dizer que ali estava
guardado um grande segredo. Ao acordar, ainda em sua mente tão vívido o sonho
da noite anterior, sonho arquetípico, merecia uma averiguação. Sabia de uma
casinha, a poucos metros de uma pequena igreja da periferia, não muito longe,
ia averiguar junto com o irmão, convidado a participar da aventura. Foram
surpreendidos com a paz e tranquilidade do local, a casa coberta de telhas
escurecidas pelo tempo, não de palha, e com uma chaminé que indicava fogo. “E
onde há fogo há vida”, disseram uníssonos.
Não tiveram dificuldade
em entrar, a porta sem fechadura, apenas encostada. Estranharam a ausência de
pessoas e um forno que tomava um terço da grande sala, o fogo apagado, a lenha
queimada pela metade. As cinzas por remover, que eles vasculharam em busca de algum
esqueleto escondido, ou algo tenebroso, que revelasse o tal segredo. Nada, apenas
uma boa quantidade de objetos de cerâmicas estavam empilhadas em vários locais
da casa, todos de um vívido colorido. Passado o espanto, resolveram atirar os
frágeis objetos contra o chão, até quebrarem tudo. Pensaram em atear fogo na
casa, mas resolveram ir embora, satisfeitos com a bárbara quebradeira. Até que
o remorso bateu, tão lindos aqueles cavalinhos, os sóis pendurados na parede,
que pareciam olhar para eles, tudo destruído.
Nenhum
proveito podiam tirar do que fizeram, tarde atinaram com isso. No dia seguinte dois
idosos bateram à porta da casa deles. Foram pedir ressarcimento dos prejuízos, tinham
quebrado toda a olaria do seu Tomás, reclamou a mulher, dona Matilde, para os
pais dos garotos. Naquele feriado haviam saído para visitar amigos fora da
cidade, na aldeia vizinha, e agora não mais tinham as peças encomendadas para
entregar aos seus donos. Os irmãos não tiveram outra alternativa senão
confessar o crime. Contaram que foram apenas em busca de uma cabana com um
segredo, conforme o sonho de um deles. “Vamos tentar reparar o erro de vocês”, disse
o pai depois de repreender os filhos. Em seguida aconselhou os donos da velha
olaria, que fizessem um empréstimo bancário e construíssem um prédio maior para
melhorar a produção da cerâmica, ele ia ajudar, era gerente de banco. Assim foi
feito. A nova construção mais alta e cheia de janelas, uma fábrica. Após uma
tragédia, o sonho do trabalho, da produção, do progresso, que se realizava em
condições mais favoráveis.
Moral da
história: Ir em busca de um segredo numa cabana misteriosa, pode levar a que se
perca a noção da realidade. Mas acontecer da vida se renovar, mesmo à custa de perda
e frustação. Mesmo que se destrua a olaria do seu Tomás, que prosperou em seu
negócio, agora fabricando peças em grande escala, entre elas imagens
religiosas, conforme ideia da mãe dos gêmeos. Essa cabana existe, sim, e tem o
sentido de transformação, de renovação.
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