ARTE- JEAN VERMEER
"ATELIÊ DO PINTOR" - A MODA
![]() |
FERNANDA TORRES COM O SEU CHANEL NO OSCAR 2025 |
O estilo solto das vestes femininas passa a ser adotado para livrar as mulheres dos apertados corpetes até então na moda, o que Vermeer mostra em seus quadros, a par dos tecidos preciosos como o da modelo, que representa Clio no quadro Ateliê do Pintor. O barroco Vermeer, cuja arte visava difundir conceitos, e não teria feito uma simples ilustração de moda, como a dos célebres irmãos Bonnart em Paris, que “faziam propaganda das pessoas e roupas, na mesma proporção”, segundo o escritor Jean Dejean, que informa ter sido justamente a moda que fez as mulheres tornarem-se empreendedoras no passado, já no tempo de Vermeer. As costureiras em seus ateliês de alta costura, as cabeleireiras com seus penteados, verdadeiras obras de arte em Paris e adjacências. Já no século XX surge o nomeado mantô, que libertou as mulheres dos espartilhos vitorianos. Roupa mais decente e saudável, ao esconder as formas do corpo e libertar as mulheres dos apertos, e Chanel, a grande stilista parisiense teria criado a veste inspirada nas roupas usads pelas meninas do orfanato onde morou. Paris que ia ditar a moda no mundo ocidental séculoas depois. Uma abordagem que nos leva a Machado de Assis, aliado dos ideais da elite liberal do seu tempo, e que se valeu da revista de moda “A Estação”, para publicar “O Alienista”. Ambos, escritor e o pintor, difundindo sua arte de escrever, ou pintar, ao lado da elegância, do progresso, quando então se passou a utilizar as riquezas, o que se pode dizer, superficial. Vermeer e Machado, aliados das mulheres, para que elas fossem cultas e também elegantes, assim como chamavam atenção para que tivessem parcimônia nos gastos. O escritor chega a internar no hospício a gastadora mulher de Bacamarte por sua exagerada vaidade.
Restabelecida em 1806 a monarquia nos Países Baixos ressalte-se a elegância de Máxima, rainha consorte da casa Orange-Nassau, casada com o rei Guilherme Alexandre. No quadro de Vermeer um suntuoso tafetá cobre a Musa, assim como há chalés de seda caindo da mesa do Ateliê, o que representa os produtos comercializados pelo avô do pintor através da cobiçada Rota da Seda entre a China e a Europa. O mesmo esmero encontra-se nos trages das demais imagens femininas pintadas pelo artista de Delft, desde as mais simples, até as de grande esmero, luxo, o que leva a imaginar que pode, inclusive, ser propaganda de algum ateliê de costura. Mas a intenção de Vermeer como pintor barroco é alertar as mulheres sobre o papel ético feminino, além do bom gosto e elegância, que devem ser cultivados no momento em que o consume se introduz na sociedade. A propaganda que Vermeer faz é do ideal de sociedade que quer exorcizar os demônios da irracionalidade, assim como da racionalidade exaltada, que teimavam em corromper os costumes. A vida liberta das obscuridades, e possa propiciar uma modernidade com pessoas compromissadas principalmente com o trabalho, além do consumo, o que é diferente e questionável o desejo de agradar, ou desagradar, de gozar a vida sem freios. Vermeer está afinado com as melhores cabeças do seu tempo, no desejo que homem e mulher sejam modernos e feliz, ressaltem o bem e o belo em cada um, e se tenha as melhores ideias, adotem-se os bons costumes, que evitam o desalento. Lógico que surgiu o que de longas datas já se temia, uma geração de deslumbrados diante dos grandes avanços científicos e tecnológicas, de uma produção de bens materiais para o consumo.
E ao fazer tombar a
máscara sobre a mesa do seu Ateliê, estaria Vermeer assumindo uma postura frente à história, anunciando o fim de um ciclo, abandonando, inclusive, o ideal
renascentista, clássico, de endeusamento dos poderosos, cujo expoente é a arte
de Donatello. Entra em jogo a pintura artística, que passa a ser
considerada superior à escultura, de visão limitada, conforme afirmação do
próprio Leonardo da Vinci (1452-1519). A clássica máscara mortuária no quadro
se confronta com a máscara do pintor, evidente em sua cabeleira gorgônica, que
esconde sua face, por conta das afinidades infernais que orientam as
investigações nas profundas águas da racionalidade, também da irracionalidade.
O duplo papel do artista de cultor e desbravador, como também de sentinela dos
lugares proibidos.
Vermeer num jogo de
paradoxos, em sua metamorfose, parece pisar chão minado em busca de inspiração
para seu trabalho, e faz sangrar. É o que insinua o vermelho das meias do
personagem, que sofre com suas buscas. O jogo louco, mas loucura no sentido de
paixão pelo que faz, na produção da arte, que negocia, sim, sendo que o
dinheiro pode levar à usura, o que se teme. O drama da civilização, ou da
própria vida, que é um jogo perigoso, quando se pode fazer pacto com o diabo. O
jogo da modernidade, que aposta no progresso, sabendo que o tempo é limitado,
que o momento de felicidade é curto. Acontece com a alma que busca a felicidade
nas profundezas do irracional, onde
reencontraria a unidade espiritual, o caso da alma alemã, gêmea da
holandesa, mas em certos aspectos totalmente diferentes uma da outra, como disse
o argentino naturalizado canadense Alberto Manguel, que nos faz entender um
pouco mais de Vermeer. O pintor mira na História, que, segundo o escritor é capaz, sob certas condições, de curar,
iluminar, indicar caminhos, sobretudo mostrar nossa condição, romper a
aparência superficial das coisas, ou das correntezas e abismos subjacentes: “A
história que pode não nos dizer quem somos,
mas que existimos, e com histórias
para contar, confrontar”. Um dilema para quem se dispõe a verificar as coisas a
fundo, no que diz respeito à natureza humana racional e também irracional. O
fator econômico e o político entram como coringas no jogo, em que o interesse
financeiro é importante, mas que haja bom senso nas decisões.
Nenhum comentário:
Postar um comentário