“ATELIÊ DO PINTOR”- A BELA E A FERA
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“Não confio em meus olhos quando considero o homem, pois tenho um
critério melhor e mais seguro para distinguir o verdadeiro do falso, cabendo ao
espírito encontrar o bem.” Palavras de Sêneca, que faz pensar se teriam inspirado Vermeer ao pintar o belo rosto feminino que posa como modelo para um feio
e desajeitado pintor em seu ateliê. Tempo dramático de virada para a modernidade. No quadro "Ateliê do Pintor" a modelo representa Clio, a musa da história, bela e luminosa, luxuosamente vestida e carregando um grnde livro e também uma mitológica corneta. Já a figura do pintor remete às lendas, e está diante do seu cavalete, sentado num banco, dando início
à sua pintura. A especial arte de Vermeer,rodeado de coisas, que lhe dão inspiração, maior ou menor, tudo junto e misturados num caldeirão, que fala da postura eclética da sociedad em que vive. como mestre em Delft. No quadro a representação alegórica do conto "A Bela e a Fera"de Challes Perraux, (1628-1703), expressão da arte barroca, e revela as intenções do pintor, eclético em sua arte, e por conta disso está
de costas, apenas vista sua cabeleira gorgônea. Esconde o rosto de “fera” ao lado da “bela” uma vez que há dúvida sobre o que se
anuncia de mudanças, o que expressa apintura. A “bela” por estar posando para o artista, uma “fera’, do
qual desconfia e trata de fechar os olhos, como se não quisesse ver o pintor,
nem o que está exposto ali, e assim volta-se para o interior de si mesma, lugar
mais seguro. O próprio pintor estaria em conflito com ele mesmo e poderia estar em dúvida sobre o julgamento que podiam fazer dos seus quadros, alguns feitos de encomenda, sua obra observada corretamente, ou provoque no observador ideia diferente da sua intenção.
O trabalho artístico na largada para os novos tempos, tempo do gato preto da bruxaria, que cede lugar às ledas, também as histórias infantis como “Gato de Botas” história também escrita por Perraux. Volumosas
meias saem do elegante escarpam,
design moderno, para dar ideia de uma
bota, as “botas de sete léguas” que na lenda protege os pés do gato em
peregrinação para fazer propaganda dos seus senhores, no caso do pintor, seus
patrocinadores. Ressaldo um vermelho,, sinal do sofrido esforço para percorrer o
chão minado da criação humana. O fundador da Nike, Philip Kiniglt: falou :“Ainda tenho os pés no chão, mas uso os
melhores calçados.” Já o também bilionário americano Warren Bufett, considerado
um dos maiores filantropos do capitalismo,
aconselha que não se use grife, mas apenas as coisas em que se sinta bem e confortável. Quanto ao artista, uma de suas mensagens parece ser para as pessoas
prosseguirem na busca pelo conhecimento, pelo trabalho, mesmo sofrido, que pode dar a proteção
financeira através do comércio, cmo do
calçado. Assim caminham juntas a arte e economia em Vermeer, como um
mago, mas no sentido de acreditar no que faz, nos
negócios. O interesse financeiro e tudo o mais que a arte é capaz de proporcionar proteção ao homem, contra as arbitrariedades do poder obscuro, do absolutismo, no momento em
que o iluminismo dava seus primeiros
passos, com o iluminado e ao mesmo tempo iluminista Vermeer
Em Pádua o
renascentista Donatello fez a estátua equestre de Erasmo de Narni, apelidado de Gattamelates, ou “gato melado”, erguida na praça central da cidade, dando
“respeitabilidade clássica ao mercenário”. No quadro de Vermeer o pintor está sentado
num simples banco, como sua montaria de pintor. Nada sacerdotal, mas felino e equestre, diante do cavalete onde exerce
seu ofício de pintar, de algum modo a lembrar o misterioso “gato melado”, ou
até mesmo o lendário gato de botas. A arte do pintor seria superior à clássica
escultura, que enaltece os homens poderosos. Vermer procurando dar destaque à mulher em pintura, no desejo de imprimir
o ideal de feminilidade e humanidade, mesmo humildade. Observa-se que sobre a mesa ao lado do artista está a clássica
escultura de uma máscara mortuária, representando o poder político, em contraponto com a máscara do mistério que o pintor inspira com sua cabeleira
gorgônica. A história do progresso material, que mesmo rude é necesário, e sendo assim, deve ter
o respaldo da arte. Tudo por conta do homem moderno, sua ciência e ambição, a sente-se poderoso, quase divino, mas que deve ter cuidado para não sucumbir ao
demoníaco.
A alegórica personagem feminina parece que olha com desdém para o pintor de estranha aparência, que pinta uma nova mulher para o mundo, conta uma nova história do feminino, da mulher, para que possa ser admirada, tenha modernidade e respeito. Misteriosa arte, misterioso mundo feminino, que não se revela total e claramente, como a própria natureza e seus mistérios. Soberba natureza, e seria uma ilusão afirmar que a mulher, assim como a natureza é possuidora de total beleza e simetria, assim como não há unidade no Universo. Muitas são as diversidades pessoais, sociais, culturais, sendo limitada a capacidade humana para entender e criar condições de amenizar de todo as diferenças entre as pessoas, as nações, culturas, e, em especial, entre o homem e a mulher. A imagem da moça que representa a musa da história, parece desconfiar do pintor em seu aspécto, que faz com que carregue o volumoso livro, e ainda tocar a corneta anunciando um novo dia para a mulher. O volumoso livro pode, inclusive, conter folhas em branco, uma vez que os saberes do passado sairam das cabeças masculinas, e por imensa que seja sua importância, há dúvidas sobre elas. E não há dúvida da superioridade do feminino na história diante da ambição, da vaidade e da fama perseguidosa pelo gênero masculino, tudo que representa a história, não apenas do passado, que estão a sua frente e atrás dela, no caso, o mapa das Províncias Unidas, seu significado econômico, político e religioso.
Sobre o chão do ateliê está posicionado o banco onde o pintor está sentado, estrategicamente colocado sobre uma cruz, feita com as peças negras do ladrilho, em contraste com as brancas. Uma representação da Cruz de Malta, das navegações de Vasco da Gama? Ou seria a cruz do sofrimento prvocado por Lúcifer,, em contraste com a luz divina? No templo de Apolo, no lugar onde a pitonisa fazia suas revelações, existia uma falha na rocha em forma de cruz por onde escapava um gás natural, alucinógeno. O poder que emana da natureza, do sonho humano de se deduzir todo o conhecimento pela revelação, anterior à fé cristã e à ciência, que veda pela cruz essas manifestações do subterrâneo, que não se deixe vagar pelos meandros da imaginação e das paixões, que levam a pessoa a cair no abismo da loucura e da morte. Tales de Mileto absorto em suas reflexões para conhecer a origem do mundo cai em um buraco no caminho. Empédocles pula no Etna, quando intimado a provar-se divino. Nietzsche cai na escuridão da mente. Profundidades que alucinam, assim como a modernidade mercantil e utilitaristas, que pode conter uma maldição.
A análise do pintor calvinista é calcada na síntese, enquanto a antítese levou ao nazismo e à Segunda Guerra Mundial. O místico Santo André foi crucificado de lado, como a Cruz de Santo André, que está gravada no chão do Ateliê, para vedar a superstição, as ambição desmedida, e tudo o mais que racha o chão em que atua o artista, como o do místico, do empreendedor, e pode vedar até mesmo uma herética ciência, sem compromisso com a vida e a moral. O chão em que pisa o homem de ciência, o artista, o artífice e o negociante, deve ser bem pavimentado para que não escape alguma maldição. certo que o lucro, a riqueza, serve de amparo contra a miséria material e social, e mesmo que a arte seja negociada, serve de proteção para o artista livrar-se da pobreza material. E no quadro, as duas figuras humanas, assim como os objeto, representam a pessoa e a coisa em si e serve de metáfora, no sentido mítico, mitológico, místico, histórico. O pintor como o Fausto da história de Christopher Marlowe (1564 -1593), filho de um bem sucedido sapateiro, também ele lembrado no calçado, como bem “calçado” estaria o personagem faustoso, conforme o texto popular alemão, onde um sábio insatisfeito com seus conhecimentos de medicina, filosofia, direito e teologia, busca caminhos alternativos. Fausto de Marlowe faz então um pacto com o demônio, com tempo determinado para acabar, e que logo se esgota, deixando-o mais frustrado ainda com os resultados obtidos, sendo impossível satisfazer sua curiosidade intelectual, ter plenamente realizados seus desejos. O desfecho é a danação de Fausto que a jurar nunca mais querer ler um livro, enquanto é levado pelo demônio.
Alquímicos e cabalísticos poderes, mágicas idéias, desejos de toda natureza, a arte barroca como expressão maior de um tempo e suas ideias. O conhecimento, que a instigar a humanidade, e, em especial, as mulheres nos quadros de Vermeer, em seus embates cotidianos, que não deixam de ser sublimes. Saberes elementares, e abstrações de maior alcance, até que o conhecimento torna-se científico, e a história, como uma ciência social, observa os fatos cientificamente. Da dúvida à certeza, e volta à dúvida, sem que se possa superar de todo a ignorância, que nunca deixou de ser santa, a Santa Ignorância de que fala São João da Cruz. Pecadores e homens sábios - entre eles os santos – habitantes desse mundo que parece nunca superar a adolescência e chegar à maturidade. Os jovens hoje mais confortavelmente instalados na casa dos pais, em dedicados e inocentes, mas também em perigosas caçadas no computador. Ou navegando em mares nunca dantes navegados, sujeitos à intempéries, borrascas, sua frágil embarcação até mesmo ser enngolidos por algum tubarão. Afinal é preciso correr perigo para ir longe, como nossos ancestrais, todavia, mais conscientes do inimigo, o que os moços de hoje ignoram. O ser humano contemporâneo, tendo assesso a uma tecnologia avançada, vendo-se na fronteira entre o selvagem e o civilizado, mas por acredita na sua condição de ser superior acha que não deve prestar contas do que faz, nem pedir auxílio da força divina. E sem recorrer a Deus a vida fica mais difícil.
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