terça-feira, 20 de dezembro de 2022

 


 

 

                                         NADA É PARA SEMPRE

 

S. LUÍS -MA

 

A s narrativas de Galvão Bueno com seus bordões nas Copas e  demais eventos esportivos transmitidos pela TV.

               O rosto perfeito de Dina Sfat na capa  de uma revista.

As crônicas de Raquel de Queiroz na última página da revista O Cruzeiro.

A elegância do casal Charles Chaplin e Paulette Goddard fotografados quando eram casados.

O recém-nascido em seu primeiro banho na bacia de alumínio com a crianças em  volta.

As figuras impróprias  desenhadas a carvão nos muros e calçadas de S. Luís.

As declamações do poeta nas reuniões em família.

O ite missa est  no fim das missas.

As tranças nos cabelos feitas pela tia, e também seus beliscões.

O comportamento pouco ortodoxo de algumas meninas, que não nos passava pela cabeça imitar.

A brincadeira de quebrar o osso do peito da galhinha e a madrinha como juíza para os irmãos não trapacearem.

O assustador isolamento na pandemia.

Palavras e mais palavras a nós dirigidas, ou que dizem por aí.

 

 

 


sábado, 17 de dezembro de 2022

 



 

                                  RECORDAR É VIVER




 

 Maria fica comovida com as palavras da coleguinha naquele novembro de 1950. “Nunca vou te esquecer” disse Socorro. O sino havia tocado no recreio para voltarem à sala de aula no último dia do segundo semestre do quarto ano primário. Encerrava-se um ciclo escolar, início das férias. Décadas se passaram, Maria lê no Facebook: “Lembra de mim?” E  dias depois: “Eu estou aqui!”. As mensagens vinham acompanhadas de fotos da mensageira com o marido comemorando bodas de ouro, também das viagens do casal pela Europa.

Cinco décadas e muitas foram mudanças pessoais e no mundo, a novidade da internet com suas redes sociais dando oportunidade para encontro e reencontros. Maria está encantada com a mocidade e alegria daquele senhora que se comunicava com ela, e procura pelo rosto que havia ficado perdido no tempo. Vasculha a mente, até que encontra a frase antiga e sua dona. E surpreendida com o enredo das suas vidas, que eram bem parecidos, Maria indaga a sorrir: “Quem copiou quem?” Vivem em diferentes cidades, e ainda se comunicam pela internet.  

 

Não ia ser fácil a caminhada, nem tão difícil, disso ela tinha certeza. Recém-casada, antes de partir com o marido Maria quis passar na Igreja para acender uma vela para a avó e rezar para a Mãe do céu, além de dar explicação a são Judas Tadeu sobre sua confiança nos dias que viriam pela frente. Do pouco que vivenciara até aquele momento e sem grande  experiência de vida era provável que mais adiante suas expectativas fossem superadas. Estava segura do que queria, assim como a pessoa que estava ao seu lado comungando o mesmo sonho. Quando ele chegou depois de algum tempo sem se verem dissiparam-se as dúvidas quanto a se unirem em casamento. Ela ficou surpresa ao saber que seu sentimento havia mudado, e para melhor, assim como acreditava que acontecia com o futuro companheiro de todo sua vida. 

 

Dezembro, e o terceiro casamento que Maria assistia naquele ano, os noivos já com algum tempo de convivência, como de praxe. Era a vez de ver seu neto conduzir a noiva ao altar para que a união deles recebesse a bênção de Deus. Após a cerimônia religiosa aquela linda festa em comemoração com os familiares e amigos dando início a uma nova etapa em suas vidas. O baile era uma novidade para os avós da noiva que observaram os recém-casados em feliz entrosamento, enquanto dançaram lindamente no salão. No passado casava-se ainda muito jovem, a união matrimonial como um ato de mais seriedade que felicidade. Dançar não fazia parte das bodas, que o casal devia com passos firmes cumprir o dever matrimonial da procriação. Sem esse doce bailar e alegre saltitar dos nubentes de hoje, que provoca inveja dos mais velhos presentes ao evento.  Maria na convicção que a felicidade tem um preço, sim, e não sai barato, ela mesma saudara com o marido todas as prestações.

 

 

 

 


terça-feira, 13 de dezembro de 2022

 



 

 

                                                         DEUS  EM NÓS!
 
           

        


                    Tempo de antes, quando as mulheres pleitearam o direito de direcionar suas vidas conforme quisessem, sabendo de antemão que ninguém é dono da própria vida de forma absoluta. E nunca a mulher foi contra o homem, ao contrário lutou, e ainda luta, para  para estar ao lado dele, em igualdade de condições. Faz parte dos direitos adquiridos a liberdade sexual, igual para ambos os sexos, em que a pílula foi de especial ajuda. A ciência coadjuvante da mulher na conquista por liberdade.
                    
                   No passado não havia esse medo de extinção da humanidade, o que hoje parece iminente, por conta dos excessos cometidos, contra natureza, e tudo o mais. As mudanças aconteciam passo a passo, sem pressa, ninguém pensava em atropelar o presente em busca do futuro incerto. Era até louvável atrasar certas coisas, e as novidades recebidas sem deslumbramento, nem angústia, chegavam em tempo e hora certa, aguardadas as mudanças. Uma confortável liberdade individual era experimentada sem alarde. Até as coisas se precipitarem numa corrida, quase igual à corrida armamentista entre a URSS e USA. E desde a invasão do Kuwait pelo ditador Saddam Hussein que a terceira guerra mundial é anunciada.
                   
                 Há perdas vantajosas, e ganho real é o saber, quando então nos libertamos do erro. E por esse saber é que sonhamos desde sempre.  À geração de Maria não causou espanto quando meninos e meninas passassem a conviver desde o maternal. E ninguém se deu ao trabalho de lastimar quando elas abandonaram os uniformes de saias abaixo do joelho, e passaram a também usar calça, até adotarem os confortáveis shorts. As novas gerações em dúvidas sobre as coisas do passado, que do nada teriam surgido, sem sua jovem e batuta presença. Tudo devia mudar. Nenhum entendimento, nada de acordos, por tudo abaixo é o que queriam os rebeldes sem causa que surgiram. E logo em seguida aparecerem os ativistas de toda sorte de causas, culminando no radicalismo de alguns desses ditos contestadores.  
                     
                 A vida hoje rebaixada a patamar inimaginável,  e todas as gerações a se sentirem mal acomodadas. No passado a vida era considerada o bem maior, ponto final. A meta era viver em paz e fazer do mundo um lugar confortável para todos. E já era tempo de terem acabado a fome e as guerras, mas são presenças constantes no tempo atual. Os poderosos chegaram a proclamar suas intervenções cirúrgicas, para a cura rápida dos conflitos. Mas a tecnologia não faz milagre, o que compete ao homem com sua milagrosa boa vontade e sabedoria. Deus em nós.

                  

 


sábado, 10 de dezembro de 2022

 


 

 

                   

                                     MEMÓRIA 

 

O POVO FELIZ NA RUA GRANDE EM S. LUÍS - MA

 

Palavras esquecidas pelo tempo chegam de repente á lembrança. Falas familiares ditas um dia, sentenças com alguma erudição, o que sobrou do passado. E aquele significativa metáfora como a cereja do bolo da memória. 

A eternidade na memória, e um dia Maria vai querer contar sua história com palavras cativantes, e de forma comovente. Ou seria melhor  não dizer coisa alguma? Aguardar que na hora da morte as pessoas falem só coisas boas sobre ela, como o padre no velório do pai, que falou sobre o homem honesto e trabalhador, que nunca havia feito mal a ninguém, e estava certo. 

 O pai de Maria nunca quis alcançar as coisas na marra. Só exigia respeito, o que nunca lhe faltou. Companheiro de uma excelente mulher, a melhor das pessoas, não só para o marido. Sorte dele e nossa por essa mãe, que viveu até não poder mais, plena de amor pela vida. Confortava os filhos que moravam longe, com suas longas cartas, sábias palavras, escritas com uma letra caprichada, de professora, de mestra. Aos demais prestava a devida atenção.


Os preciosos cadernos pautados de Maria candidata ao exame de admissão, continham farto número de problemas de matemática, assim como  dissertações e composições. E tinha ainda um caderno de capa dura com as letras de música, que nada tinham a ver com a jovem, mas eram palavras, e com elas se encantava: “coqueiro velho abatido pelo vento, ninguém sabe os desenganos dessas folhas abatidas pelo vento”...

“Olha a lua, Maria, veja como está cheia d`água”, o aviso poético da tia, sinal de chuva.

Anos 40, o trem parado no fim do mundo apita que vai partir, e lá longe vem uma mulher atravessando o areal com compras na mão, pela janela as crianças gritam para ela apressar o passo: “Mais depressa, mamãe.”

No filme Marcelino está compadecido do Cristo na Cruz, e  fala: ”Você tem cara de fome.”  Um adorável menininho que vive no convento com os frades, seus bons amigos. As palavras que ele diz ao crucificado reflete a mais triste consequência do abandono, que é a fome, entendida não apenas pela falta de comida no prato, que castiga no corpo. Fome de amor, que dói na alma.

 Ser feliz é uma espécie de vocação pessoal, até mesmo predestinação. Tem gente que ama  a vida, mesmo em dificuldade. Pode fazer parte da genética essa inclinação, essa índole, quando há pessoas simplesmente felizes, enquanto seja difícil para outras, que estão sempre descontentes com tudo, mesmo que consigam o que querem, ou justamente por isso mesmo. O sentimento de pertencimento, de bem estar, desde o berço - o  que o amor promove e faz feliz.   










COM MODERAÇÃO!
 

domingo, 4 de dezembro de 2022

 


 

 

       

                                                  DE AMOR E PAIXÃO 




 

— Quem somos nós para afirmar o que é e o que não é uma boa vida.  

Palavras ditas por uma parenta a Maria, que de imediato pensou na mãe e sua afirmação de que a pior vida era melhor que vida nenhuma, ou a morte. E no entendimento de quem fora a mãe,  e ela própria décadas atrás, quando não havia como querer outra vida senão casar e em contrapartida ter uma casa com marido e filhos para cuidar. O homem com seu próprio planejamento a cumprir, conquanto seu destino fosse encontrar sua companheira em algum ponto do caminho.

Pena que a avó de Maria nunca tenha obtido o perdão da filha, desde que  posicionou-se contra sua paixão e casamento. Não há como julgar pessoas que legaram grandes ensinamentos aos descendentes. Tem gente que goza da paixão pelo dinheiro e por tudo o que ele propicia. As mais sábias preferem viver de outra forma, sem essa questão de querer boa vida, ou ser feliz a qualquer custo. Depois de uma conversa nesse sentido Maria aos quinze anos recebeu um ultimato de Mário nos seus dezoito, que antes de partir  para estudar fora, despediu-se com um olhar, mais de compaixão que de paixão, e as míseras palavras:

— Temos um longo caminho a percorrer. Que eu possa mais adiante alcançar você, e você a mim. Não nos percamos de vista.

Maria deixou a vida fluir, cientes que qualquer caminho não ia servir para ela chegar a autossuficiência e vida plena, sua pretensão. Logo percebeu que o universo está pronto para cuidar das pessoas que sabem para onde quer ir. Importa ter meta a cumprir, sem deixar de dar espaço para as surpresas. Ter cuidado, que há as boas surpresas e as ruins. 

  Por descuido Maria havia perdido a oportunidade de um bom emprego, mas não ia perder a esperança, sempre viva dentro dela. Simplesmente recomeçava, no que ia se tornar mestra. Até alcançar a maturidade, inclusive, no amor. Maria agora observava sua própria vida, e a vida em sua volta, e verificou o quanto uma paixão pode ser decepcionante a longo prazo. Certo  que a vida pede atenção, cuidado, e que se desconfie dos aplausos e julgamentos apaixonados.

Ano de 2022, da Copa de futebol no Catar, e lá está o antigo casal, desfrutando o feliz reencontro de décadas atrás, e como todo o Brasil na torcida pela seleção de Tite. Sobre a paixão do torcedor pelo futebol o neurologista Conrad Estol aponta para as emoções despertadas pelo fanático ao assistir um jogo, que se semelham a "um coquetel de condutas anormais" no qual se mistura a paixão, similar a de Cristo que compreende a aceitação e sofrimento como essenciais  à vida. Maria, todavia, pensa na diferença entre a sensação vinda do instinto de competição, primitivo, o caso do futebol, enquanto nos eleva a nível de compaixão a outra sensação, ambas necessária para o equilíbrio das emoções. 

 Diferente da paixão do futebol, a  paixão de Cristo serve para despertar a compaixão, que se segue à sua paixão.