sábado, 20 de fevereiro de 2021

Andrea Bocelli - Somos Novios -Live From Castagneto Carducci, Italy / 2001

 

 


 

 

 

À SOMBRA DE GUIMARÃES ROSA

                  

                                                     NOTÓRIO AMOR

 


 

 

Absurdo possível um silencioso coração suspirar de amor, mal o baile começara, no distante maio da década de 60. Remígia amadurecia na casa rosa da estreita rua dos Prazeres, a vida no conforto das doces horas, o asfalto já cobrindo as antigas pedras de S. Luís. E sob influência da desconsolada espera, ela entrou em regozijo. Antes as coisas se negavam, agora pareciam confirmar o que sentia.  

O que Remígia sentiu terminada a festa seria amor de verdade? Tivera um namorado só, um rapaz de conversa entranhada de velha. Esse outro em atitudes despudoradas de novas. E tomada por um sentir de todo abrangente, ela foi em frente. E como condenar uma moça que se sente segura de si para aceitar o pedido de casamento, mesmo com um estranho? E assim foi, ou ia ser. A família concorde, o que se há de fazer? Confirmado o pacto de amor, que se daria mediante sacramento, mistério grandioso.  

Um modo de medo, quem sabe suspeição do que por derradeiro possa vir a acontecer em certos casos. De toda feita aflora o júbilo pelas bodas. Obscuridades existem, não tem como negar, e por um mínimo de esclarecimento da narrativa amorosa sondar as consciências, rever os sentimentos a fundo, ou até mesmo ler nas estrelas. Naquele lugar sem desigualdade, mesmo assim, cismavam todos com aqueles que se amam  além da conta.

Se é direito humano dispor de tudo, e ter grande vontade, que se faça conforme o raciocínio, além do que move a fantasia, ou lhe aquece o sangue nas veias. Mas ser dono do seu querer é o que todos almejam. Sem esquecer os óbvios do bom senso, que não é dado a todo humano possuir. Remígia ia correr lá para longe com um desconhecido, o espaço do entendimento da enamorada muito pouco, quase nulo

Acontece que ainda não era dessa vez que Remígia ia casar. Após uma semana, ou mais, o noivo desapareceu sem mais dar notícia, com certeza era casado, lá no quinto dos infernos, pensou a noiva, conformada de ficar para tia, já tinha cinco sobrinhos dos irmãos maus velhos. Mas um terceiro pretendente haveria de logo surgir em sua vida, dessa feita sem fala antiga nem modos novos, tudo dentro dos conformes - notório amor.

Aos modernos moços, tão queridos, até mesmo adulados de hoje, o que tenho, por fim, a dizer, é que não fujam da felicidade, mas aguardem. Preservada a fé entre homem e mulher, clara evidência. E que os novos casais não percam nunca a mútua fé, esperança e caridade. Amém!

 

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2021

Máscara Negra

   

FIQUEM EM CASA

 

 

 

          JOAQUIM E SUAS LEMBRANÇAS                


 

TEATRO ARTHUR AZEVEDO S. LUÍS-MA

 

Noite quente de 7 de março de 2020, no lindo e confortável Teatro Arthur Azevedo, em S. Luís - Ma, os atores Miguel Falabella e Zezé Polessa apresentam a peça A Mentira. Joaquim está em visita a cidade onde nasceu, e já se acomoda para assistir o espetáculo. Antes de sentar-se observa com admiração a cadeira de madeira entalhada e o estufado de veludo vermelho,  restauração primorosa, tão do seu agrado como arquiteto e decorador, assim como toda a beleza do teatro recém-reformado. Pensa que nesse mesmo teatro havia nascido em 1854 a grande atriz Apolônia Pinto, no camarim nº 1, quando a  mãe, atriz  portuguesa, entrou em trabalho de parto, em meio a sua apresentação.

Do camarote, que compartilha com outras três pessoas, Joaquim olha a plateia e acha que em questões intelectuais e artísticas, está acima dos que ainda agora, antes do espetáculo, riem e cochicham. Estariam estranhando, no seu caso, que estivesse sozinho, sem esposa, ou noiva? Será que aquela gente ali presente lê e se dedica ao estudo como ele? Salvo raras exceções, o caso do professor Nascimento de Morais Filho.  S. Luís não era mais a Atenas brasileira, dos grandes talentos literários, mas ainda com muita gente talentosa. No camarote em frente ao seu, avista Alfredinho e esposa. Olha o casal e agradece aos céus  por  estar noivo de uma moça como Patrícia, dentro do seu círculo social, escolha que agradou em cheio a família. Já o amigo penara com a desaprovação das irmãs, e havia até ameaçado as três de morte, a mãe falecida logo após a morte do pai.

Toca o segundo sinal para início do espetáculo. Joaquim volta a olhar para o amigo, parece feliz. E não deixa de ter uma ponta de inveja pela audácia de Alfredinho, que havia desafiado a família e impôs sua vontade para casar com uma viúva, mesmo sem filhos. Há casamentos que agradavam em cheio as famílias, e outros  do desagrado geral, ou parcial. A indiferença só acontece quando não há interesse financeiro envolvido, e se dizia que casamento e mortalha no céu se talha. Tempos da inocência... É aceitar a pessoa como ela é e pronto, pensa Joaquim, que não acha de forma alguma ser sua futura esposa  uma tola, desejosa de agradar aos outros, mas uma pessoa verdadeira. Tivera dois anos para aquilatar seu modo de ser, sua personalidade, sem as fragilidades que podem arruinar a vida do casal. Afinal achava que mulher era mesmo o esteio da casa.

A comédia a ser encenada no palco, que acaba de abrir as cortinas, é sobre a arte de esconder a verdade para proteger a quem  se ama. E vem à mente de Joaquim a célebre controvérsia entre Benjamin Constant e Emmanuel Kant a propósito de direito de mentir, o que requer uma reflexão ético-filosófia. Na peça, a personagem Alice surpreende o marido de sua amiga com outra mulher. Deve contar o que viu? Paulo, seu marido, a convence a esconder a verdade, e com o desenrolar da trama fica-se sabendo que ele mesmo traía a esposa. Aliás, os quatro personagens traem-se mutuamente. Pensa Joaquim que casamento não é para amadores. E quer adivinhar o que acontece com o amigo fleumático e dominador como costumava acontecer com os maranhenses e seu machismo. Mas o que ele não queria era aborrecimento com a família, muito menos com a mulher com quem ia conviver por toda sua vida.

O espetáculo chega ao fim, e, antes da debandada geral, formam-se as rodinhas para comentar o que acabam de assistir, e em especial, comentarem o tempo ruim, tanto na política quanto na ameaça de um vírus que acabara de surgir em Wuhan na China e podia chegar ao Brasil a qualquer momento. Essa poderia ser a última aglomeração das pessoas, e talvez por muito tempo. É correr para casa e ficar aguardando os acontecimentos. Joaquim já percebera no aeroporto pessoas de máscara, achou aquilo ridículo, gente medrosa, pensou. Mas parece que a coisa é feia mesmo. Adeus festa de casamento, sua noiva maranhense reside no Rio, como ele, festeiros ambos, mas agora  devem se conformar com uma recepção íntima.

Joaquim ainda dá a última olhada na fachada do prédio reformado de pouco, e logo embrenha-se na escuridão das ruas ludovicenses, quase todas as casas abandonadas, constata com tristeza. Promete a si mesmo comprar uma meia-morada para reformar e passar temporadas na sua amada S. Luís.

  

 

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2021

Barn Raising Dance (7 Brides for 7 Brothers) - MGM Studio Orchestra (HD)

 

 BOA TARDE!


 

 

 

                                     NOTÓRIO SABER

 


 

 

Grandes nomes honram a humanidade pela dedicação ao estudo, à pesquisa, à educação, reconhecidos formalmente como uma pessoa de notório saber. Cientistas, intelectuais, e demais membros da sociedade, que contribuem de forma cabal ao bem estar social e o progresso.

Além dos bens materiais e intelectuais há os valores espirituais e morais, com pessoas valorosas, de fé inabalável, notáveis em seu saber, o caso dos membros laicos da igreja católica, que contribuíram de forma decisiva para sua religião, como Emmanuel Mounier, G.K. Cherteton, Edith Stein, Simone Weil, e muitos mais. E tem os santos, venerados nos altares, por seu saber e santidade.

Há ainda que reconhecer o saber milenar, expresso em evocações ao alto, cantos, rezas, ritos, "benzeduras", curas, culturas, realmente notáveis, que foram passados informalmente de geração a geração, cujos guardiões merecem receber o título referido acima.

Eis que somos, na realidade, homens e não super-homens, nem sub-homens, e sim criaturas com um destino gloriosamente, compatível com a condição humana, acima de toda vanglória, que nos tempos atuais chega às raias do absurdo. A animalidade, ainda no nosso calcanhar, que nos faz ser, em parte, quem somos, mas que nos pode embaraçar no cumprimento da nossa  condição humana.

E não se perca a cabeça, mas humildemente reconheçamos nossa insignificância diante dos mistérios de Deus. Há pouco, os cientistas descobriram a vacina contra o covid19, merecem todo nosso respeito e consideração, assim como aqueles que trabalharam ao lado dos enfermos:  médicos, enfermeiros e todos os demais profissionais de saúde. Não podemos menosprezar o conhecimento científico, mas respeitar os seus limites. “A ciência é poderosa, mas não pode ser guiada pela arrogância”, diz o físico italiano Guido Tonetti.

 

 

 

 

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2021

 

 

 

                                    PAULO DE TARSO

 


 

Marta convida Mirtes e Sofia para acompanhá-la ao retiro espiritual que ia fazer no colégio católico onde cursara todo o ensino, até entrar para a faculdade. Convite que as duas amigas de imediato aceitam, mesmo não sendo católicas praticantes. Já estavam no terceiro e último dia do encontro, tinham acabado de assistir a palestra sobre Paulo de Tarso, e estavam ávidas por um cafezinho. Como sempre fazem vão até a cantina.  Mirtes apressa-se em revelar ser apaixonada pelo santo, fala primeiro:

— Uma bênção ter existido ao lado do apóstolo Pedro o exegeta Paulo de Tarso, judeu de nascimento e cidadão romano, que se converte em Damasco. A doutrina apostólica santamente elaborada por Paulo, pôs abaixo as crenças existentes na imperial Roma, até então o centro do mundo e um cadinho cultural. Decadente Roma, então surge uma nova fé, sendo perseguida e obrigada a se refugiar nas catacumbas.

Marta também dá seu depoimento sobre o apóstolo tardio de Cristo:

— O nascente Cristianismo acaba por reerguer o mundo antigo em novas bases. Um verbo transformador o de Paulo, que prende e liberta ao mesmo tempo, que desfaz os nós responsáveis pelos entraves ao desenvolvimento espiritual. Universal, Paulo impulsionou as  mentes de então a alargar os horizontes da alma, como acontece até hoje. E lendo suas cartas sinto ímpeto de obedecer ao seu chamado, como ele obedeceu à voz que o chamou.

 — O mesmo acontece comigo — fala Sofia. Por essa paixão fui tempos atrás a Éfeso, na Turquia. Pude sentir a força da presença de Paulo naquelas ruínas, falando de Jesus Cristo e sua ressurreição. Aspiro chegar ao entendimento de suas palavras, mas tenho a cabeça tão repleta de imagens, leituras, e tudo mais que a minha sôfrega curiosidade mental alcança, em detrimento do que minha alma aspira. Mesmo assim, no mínimo, faz-me um bem imenso saber da existência de Paulo, conhecer suas ideias.

Marta é católica praticante e também apaixonada por Paulo de Tarso, volta a falar:

— Paulo de Tarso consolidou o cristianismo. Mesmo sendo um homem controverso, de início, mas com sólida cultura, e espiritualmente amadurecido para a fé que ia abraçar e defender até a morte. Sem Paulo não sei o que seria da fé cristã, tão santa e tão castigada por seus erros. Paulo foi decapitado  em Roma, no ano de 67 dC. Aconteceu após intensa doutrinação do São Paulo pelo mundo, a quem legou obra extraordinária.

As amigas tinham que voltar para a última palestra, as três dando demonstração de estarem saudosas daqueles dias. Estavam cientes do muito que aprenderam, e mais ainda, vivenciaram no convívio de tantas almas se não de todo santas, predispostas ao bem.