quarta-feira, 2 de junho de 2021

 CONTO

 

                                  COMO PEDIA O MOMENTO

 

 


 

Tarde de verão, a brisa vindo do mar amenizava o calor, Selene ia a caminho de casa sobraçando alguns livros tirados na biblioteca da faculdade. Refletia sobre um baú de ideias, quando viu alguém vindo em sua direção. Por segundos veio-lhe a lembrança daquele que seria  a pessoa  ideal para ela, quase tropeçou na calçada. Dois anos antes, a despedida deles fora pouco calorosa. Não podia ser ele, morava em outra cidade, àquela hora estaria longe dali...

O rapaz olhou para a moça à sua frente, certo que a conhecia. Sorriu com um prazer genuíno. Exclamou:

— Selene!

Com os livros apertados nos braços para não caírem, o que parecia na defensiva, ela sorriu de volta e respondeu:

— Tiago, você por aqui?  Estou surpresa,  quase me fizeste desmaiar de susto.

Andarem por alguns instantes e avistavam o Centro Histórico, onde viveram antes da cidade ter crescido desse outro lado. Ele convidou-a para atravessarem a ponte, fez menção de carregar-lhe os livros, mas ela não quis separar-se deles. O percurso não era muito longo, iam conversando. Ela pensou que também teria que construir uma ponte até ele, com vigas para torná-la segura, sem astúcia, nem incertezas, gostava da pessoa firme em suas convicções, como ele parecia ser. 

                    Ela simplesmente agradeceu por ele estar ali e falou-lhe que havia concluído o curso de psicologia: 

- Obrigada por ter vindo, acabei de me formar. 

Ele segurou-lhe a mão enquanto andavam e falou-lhe:

- Estou feliz por encontrá-la.

As lembranças iam fluindo na mente de Selene, depois que Tiago partira foi passar as férias no Rio, uma prima convidou-a para conhecer a cidade maravilhosa, que  boa surpresa. Mas era do presente que o rapaz a seu lado queria falar. Apressou-se em dizer-lhe que já tinha um bom emprego na cidade onde morava, ia concluir o curso de Direito, talvez fizesse um concurso público para ter mais segurança na vida.

Ele conferiu os livros que ela levava consigo,  três obras suas conhecidas, elogiou-lhe a escolhas, e disse que dentre os três gostava mais de A República de Platão. Os outros dois eram uma coletânea dos poemas de T.S. Elliot  e Poemas para Rezar de Michele Quoist,  poetas que Selene amava.

  A cidade como um presépio visto de longe, pena que o casario estivesse em abandono, todos a lamentam o fato, e sabiam que alguma providência haveria de ser tomada para salvar aquele importante patrimônio. Depois da ponte inaugurada em 1970 a debandada foi rápida em direção às praias. Um barco a velas navegava calmamente  pela a enseada do rio  Anil. Outros tantos barcos de pescadores avistados mais distantes. De repente Selene se sentiu navegante de uma embarcação encalhada. 

A rapidez com que as coisas podem mudar. Há poucos dias a recém-formada, desde que chegara do Rio, só pensou em concluir a faculdade para começar a trabalhar. Naquele momento o coração dela batia forte à medida que se aproximavam da paisagem antiga. Pressentia que algo ia acontecer. Já estavam à beira-mar, iam subir a ladeira em direção do Colégio Santa Teresa, quando ele a pediu em casamento. Tinha vindo buscá-la. 

Casaram um mês depois, sem pompa, como  pedia o momento. Selene  sentiu que  dava novo brilho a sua trajetória, até então,  brilhante. 

 

 


 

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