terça-feira, 28 de setembro de 2021

 




 

                                  VERMEER E O CUPIDO


com e sem cupido


Jean de Vermeer faz parte da extraordinária pintura holandesa do século XVII, na idade ouro do país onde nasceu e viveu, precisamente em Delft. Seus quadros guardam segredos, que até hoje os peritos e pesquisadores anônimos buscam desvendar. E mistérios não faltam nas obra do mestre de Delft, também sobre sua pessoa. Com técnica avançada, algum tempo atrás foi descoberto  um quadro do mitológico Cupido, deus do amor, em “Mulher Lendo uma Carta à Janela”, do qual foi excluído. O pintor teria posteriormente optado por deixar a parede da sala em branco. Pintura dentro da pintura, uma meta pintura, por se tratar da reprodução de um quadro que fazia parte do acervo de Maria Thim, mãe da esposa do pintor. A mesma reprodução do Cupido pode ser vista no quadro Senhora de Pé ao Virginal,  onde uma elegante figura feminina posa para o retratista, enquanto dedilha o instrumento musical, tendo a suave feição voltada para o retratista e nós, os observadores do quadro. 

O tema do amor é uma constante em Vermeer, e no quadro da jovem musicista, é de supor que se trata de candidata ao casamento, uma noiva, o alto astral que ela transmite. Diferente da mulher no outro quadro citado, quando o tema parece ser do amor fati. Daí o cupido ter sido excluído da cena. A carta que a mulher lê diante da janela aberta à sua frente, esta com o papel amassado dando ideia de ser um folheto, e ter passado de mão em mão. A técnica da impressão recém-inventada, facilitadora da difusão de ideiasUma figura fantasmagórica aparece na vidraça, como a refletir a imaginação da leitora da carta, Bem vestida  e penteada ela tem ao seu lado esquerdo uma bacia de frutos passados. A figura na vidraça e os frutos se comunicam, para falar do ser frágil que seria essa mulher, em meio à realidade da vida, suas dores (e prazeres) do nascimento à morte. Os frutos já não servem mais para consumo, perderam valor, e essa mulher sofre (ou celebra) aquele momento, como pessoa e membro de uma sociedade em transformação. 

Há que considerar o dramático sentimento da impossibilidade de conciliação entre culturas, entre pobres e ricos, entre os sexos, e tudo o mais. Os homens em sua conquistas pelos mares que eles procuram desbravar, enquanto as mulheres empreendiam suas buscar em outras águas, não menos perigosas. As fogueira queimando bruxas, na realidade pessoas que lutaram com o conhecimento que tinham, antes da ciência, e muito realizaram para que a vida fosse menos cruel em casa e até mesmo fora do lar. Na progressista Holanda os mais afortunadas seguem os modismos da época, inclusive das superstições, que grassavam a sua volta, e são difundidas através de folheto impressos. Nesse caso, a mensagem que a mulher recebe diz respeito à sua liberdade, daí a janela aberta, mas ela precisa ter cuidado.

Por qual motivo o Cupido foi retirado da sena? A resposta estaria, pois, contida na mensagem da carta, que não seria de amor entre um homem e uma mulher, e o cupido some de cena, fica escondido debaixo da cal da parede. A mulher precisa ter cuidado, alerta  Vermeer em seus quadros, que têm a intenção de instruir, conforme requer a arte barroca. E aquele é um dramático momento de mudanças, início da idade moderna. que requer uma boa consciência. O pintor é protestante de nascimento, convertido à fé católica, religião professada por sua esposa, e suas pinturas são mensagens com intenção de atingir as profundezas da alma feminina. As mulheres consideradas esteio do lar, que se instruam, sigam os ditames da razão e não esqueçam os preceitos divinos contidos na fé religiosa.  


Senhora de pé ao virginal

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