sábado, 24 de agosto de 2019







                     
                HISTÓRICA S. LUÍS do MARANHÃO









           O livro Estas Histórias, de Guimarães Rosa, foi publicado postumamente pela filha do escritor, após sua morte por infarto aos 69 anos. Com grande emoção a também escritora Vilma Guimarães Rosa fez a apresentação da obra, à guisa de prefácio, com o significativo título Apenas Saudade, para que o público leitor pudesse apreciar mais uma vez as histórias e especial linguagem de um dos maiores escritores brasileiros. Trata-se de um conjunto de novelas, ou contos longos, que inicia com  A Simples e Exata Estória do Burrinho do Comandante, que   acontece  quando uma pequena embarcação inglesa, Amazonas, aporta em S. Luís, capital do Maranhão, lá permanecendo por dois anos, na década de 20 do século passado. O Burrinho, era o mascote do Comandante, que guardava o retrato da figura do animal, descrita como “enfeite, feito por pessoas do terreiro, brinquedo, indígena na poesia...guardava além do mais, a paradoxal aura de inteligência peculiar dos burrinhos"...O Comandante tirou de una gaveta para mostrar ao ouvinte, antes de começar a contar sua história.

           “Deitamos  amarras”, fala o Comandante em sua narrativa, e continua: “Dali do meu navio, eu contemplava, acolá da muralha, casas e coqueiros a cidade em dois níveis. Em algum trecho do porto, na baia, em outros coloniais tempos o cais se chamava Cais do Desterro”. A certa altura pergunta o Comandante ao seu interlocutor, ou o leitor: Conhece S. Luís? E ele mesmo responde: “É antiga, tresanda a decorosas famagorias, e grava com um relento de torpor o passado, não obstante a certa e simpática veemência de seus habitantes. Achei-lhe encantos. A cidade estimável, com suas ruas desenvolvidas de distortas, de várias ladeiras, as ricas igrejas de repente vetustas, diz-se que são entre si ligadas por subterrâneos cheios de morcegos...Os sobrados centenários imensas quadras desses, sobradões de dois ou três andares, mansões  de beirais salientes, balcões com grades de ferro bem trabalhadas, mirantes.  E azulejos, azulejos, por vezes se estendem até as cimalhas; depoentes aspectos... S. Luís tem águas por todos os lados. Os rios são o Bacanga e o Anil”.

             Palavras do narrador, o Comandante : “Estive em S. Luís do Maranhão porque a Coluna Prestes andava operando seus rebuliços por dentro do Piauí, apalpando a arpéu os governos dos dois Estados. A ameaça era estudável... No Norte, política foi sempre mar perigoso; política e tudo o mais, há quem diga...Digo que, a bom seguro, o qualquer engano se resolveu, e corrigido e correto, por toda a minha missão e estadia, como pelas cartas do Almirante inglês... Despedidas e abraços. Apreciei bem aquela cidade de S. Luís do Maranhão, de sobrados de azulejos e singulares ruas, de muita poesia. Tocava uma banda de música — as retumbantes marchas — e já para trás... Ao mar o Comandante retornou, do mesmo mar de onde veio o burrinho: “O burrinho para mim veio do mar, segundo o sutil da vida, coisa caligráfica...Ainda hoje, quando penso nele, me animo das aragens do largo. Apareceu-me num dia vivido demais, quase imaginado...”  


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