quarta-feira, 28 de outubro de 2020

 

FICÇÃO

 

                              
                         REVELAÇÕES




 

 

Interiorana e citadina, quase em iguais proporções, Maria tem a alma jovem, companheira de um corpo, que um dia esteve no apogeu do vigor físico, e hoje sente os começos da decrepitude. Ao chegar mais perto do fim, pensa no sagrado e no profano, que acompanham desde sempre, e que de bom o primeiro tenha a supremacia.O colégio das freiras e sua inesquecível capelinha.

Octogenária, costuma dizer, que o melhor de tudo foi ter vivido com parcimônia. Morou em diferentes lugares, hoje, na casa onde habita, quando não está na cozinha, permanece no local de estudo, tendo ao lado o parceiro de muitos anos. Mexendo nas panelas, ou dedilhando as teclas do computador, seu empenho é o mesmo, as atividades exercidas com satisfação. Dá sempre o melhor de si no que faz.

Os que a conhecem sabem da sua feroz vocação para a solidão, talvez herdada da avó, longe das festas e afeita ao trabalho doméstico, com seus afamados doces completando a renda de viúva. A neta ocupada em seu modesto trabalho e algumas celebrações, como os encontros familiares aos domingos, que lhe satisfaziam plenamente o sociável. Mudanças e longas viagens ficaram para trás, que há tempo para tudo.

Preservado o dom de servir, inerente ao ser humano, e outras coisas essenciais. Deita para dormir, e um mar de lembranças afloram à mente, escombros. O companheiro ao lado não se dá conta, ela custa a adormecer. Mente afiada, em noite longa e traiçoeira. Mergulha em turvas águas, periga afogar-se. Procura soluções para o mundo. O sono chega, por três a cinco horas, o necessário para recarregar as energias.

Ao despertar Maria vai ao encontro da felicidade possível no seu dia a dia. Sempre assim, pronta para enfrentar o cotidiano. Aquele problema do dia anterior? Já tem a solução.     

 

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