domingo, 24 de outubro de 2021

 DIA MUNDIAL DAS MISSÕES

24  de outubro - instituída a data pelo papa Pio XI, em 1926


                           O MOVIMENTO DAS MISSÕES

 


 

 

 

 O quadro Mulher com a Jarra de Água seduz o observador de modo especial por se tratar da representação de uma possível candidata ao trabalho missionário. Representação do humanismo da fé no mundo medieval. Saía a Europa das trevas das superstições e perseguições religiosas, e vendo possibilidades no mundo em expansão.  Oportunidade de realização feminina fora do ambiente fechado do lar, ou de algum mosteiro onde muitas mulheres se abrigavam na época, por força das circunstâncias. A mulher e a civilização numa renovação pela riqueza das terras além-mar, e pela fé missionária. A Igreja assume então a missão de preservar a fé e educar os colonizadores, dever que se estendia aos povos nativos, de convertê-los e livrá-los da exploração.  

A jarra de prata para água, o que a difere dos vasos fechados de cerâmica vistas em outros quadros de Vermeer, contendo produto destilado, ou oculto. A água do batismo cristão, a pureza da água, onde a vida se origina, sem água e sem luz não haveria vida. O mesmo se pode dizer da fé, que alimenta o espírito, a ponto de não haver bem estar sem ela. A água pura do batismo espiritual, próxima da abstração pela transparência, metáfora para a fé missionária, tridentina, contrarreformista. A mulher segura a jarra mantem o olhar posto no pálido vitral da janela semiaberta de algum mosteiro, de onde irá partir, na esperança que a fé católica lhe transmite. Ela está feliz por pertencer a algo que lhe proporciona  segurança material e esperança de uma boa consciência, compromissada com o mundo em que vive. Importa a realidade que vai além da simples vontade e liberdade, tanto para a fé, quanto para o gênero feminino, que goza da felicidade de ter uma missão a desempenhar, fruto da ação católica, que passa a atuar fora dos muros erguidos para limitar seus anseios. 

Há um caminho novo aberto pelas Missões em todo o mundo, o que diz o mapa pendurado na parede. A fé renovada, em ação social, após a ruptura protestante e lutas religiosas. Luminoso despertar para quem tem uma fé que a protege, com a qual pode ver o mundo, as outras pessoas, as coisas, como são de verdade. Conjurado o fantasma da angústia, da dúvida, do medo, emerge uma nova mulher, que vai ter consciência de si mesma, e que verá o mundo de modo mais límpido, transparente. Os valores cristãos contrapõem-se ao fogo das guerras, das ambições terrenas, que exacerbam as paixões na alma. Heroico o trabalho das Missões. Em vez de ideias sombrias, de fogos-fátuos, surgem as obras missionárias ancoradas na fonte viva da espiritualidade cristã. A trajetória do espírito em missão evangelizadora aliada à mente em busca do conhecimento racional, científico. As velhas certezas e incertezas se veem diante de novas esperanças, que chegam com a descoberta  da natureza pura e exuberante do Novo Mundo. O mundo mágico da América, decantada por Pero Vaz de Caminha em sua carta, sobre as riquezas da terra brasílica, recém-descoberta, “em que se plantando tudo dá”. Já no século XVI o missionário espanhol Bartolomeu De las Casas, ao saber das ações cometidas pelos espanhóis contra os nativos nas Américas, declara: “Todos os homens são iguais no que diz respeito a sua criação.” Os missionários da Companhia de Jesus acusados de irem longe demais ao condescenderem com os povos do Oriente e suas filosofia, que se veem às voltas com as crenças dos nativos do Novo Mundo. Acusação feita pelos jansenistas contra os jesuítas que teriam adotado as superstições com uma boa vontade suspeita. 

 Vermeer teria absorvido ensinamentos dos jesuíta, vizinhos de sua casa em Delft, que lhe encomendaram um quadro sobre a fé. Fez dois: “Alegoria da Fé” e “Moça com Jarra de Prata”. Heroica a trajetória humana, suas paixões a par de um conhecimento que se quer racional, científico.  No limiar dos tempos modernos encontram-se razão e fé. A busca é por uma vida interior rica, ao lado do também rico existir cotidiano, mundano, transoceânico. Grande parte das mulheres europeias boas religiosas, prontas para prestar serviço à Igreja como missionárias, também no exercício de outras funções sociais. O grande missionário jesuíta Antônio Vieira acreditava na conversão universal a cargo da Coroa lusitana, em sua aventura pelo mundo afora, seguindo o desiderato de um destino venturoso, após a derrota na batalha na África em que morreu o rei de Portugal, dom Sebastião, fato que se tornou uma lenda. Em sua “História do Futuro” Vieira, considerado “apóstolo das navegações”, abençoa o trabalho missionário,  diz aos maranhenses: “Os homens de quem aqui fala Davi são aqueles que estão nos dois últimos extremos da terra onde nasce o dia e a noite; uns nos confins do Oriente, que são as Índias Orientais, outros nos confins do Ocidente, que são as Índias Ocidentais.” Lá “no fim do mundo”, de onde teriam buscado o papa Francisco para Roma, conforme suas próprias palavras.

 Motivo de otimismo os europeus tinham com tanto ouro, prata e pedras preciosas, exploradas na América espanhola, depois no Brasil português, a partir de 1700. “Um Eldorado achado nos trópicos”, como se dizia. A fé caminhando ao lado do poder temporal, onde são travadas lutas tenebrosas na disputa das almas e das riquezas, no mar, na terra e no “céu”. A Europa seduzida pela filosofia oriental. Para o confucionismo, a principal meta da existência é o desenvolvimento do caráter. Na doutrina de Confúcio (600-500 a.C.) o pessoal é o social. O taoísmo de Lao-tsé (VI-V a.C.) prega que o “pessoal é a relação com a cultura”. O caminho do Tao é para que se forme uma sociedade harmoniosa com fé na natureza humana e tolerância para com os homens sem instrução e cultura, pois o que importa é a sintonia com o ritmo da vida, de acordo com o que lhe é próprio. Todavia, o taoísmo discorda da ideia da bondade inerente ao ser humano. Há que distinguir a filosofia oriental e a cultura primitiva dos nativos da Américas. Assimilação houve dos povos nativos; no Brasil, do deus Tupã, tem Iemanjá, já no México a divindade feminina é chamada de Pachamama. Para os católicos é fundamental crer em Nossa Senhora, perfeita e superior manifestação do feminino dentro da religião católica. 

Aos grandes educadores jesuítas no seu trabalho missionário devemos o bom costume da leitura, padre Vieira sendo o pioneiro, ao fazer chegar ao Brasil as primeiras publicações. Grande propagador da fé católica, defensor dos nativos, contra o massacre cultural e o trabalho escravo. No nosso país imenso é o legado das Missões, tendo os missionários fundado o primeiro colégio em São Paulo, dedicado ao “ensino dos rudimentos”, ou elementar, de ler, escrever e contar, justamente por onde tudo começa. A evangelização efetiva feita através da educação.

 

 

 

 


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