sexta-feira, 17 de janeiro de 2020






        
                                                  DISCERNIMENTO







Marina estava em inspeção numa prefeitura do interior de Goiás, designada como inspetora federal para averiguar uma denúncia sobre desvio de verba. Depois de um dia de trabalho, de volta ao hotel onde estava hospedada, ela caiu na cama exausta. Adormeceu ainda sob o peso do cansaço mental, e não foi estranho que  sonhasse com algo que dizia respeito ao seu trabalho, e também à sua vida pessoal, já que estava noiva e prestes a casar. Sonhou com a tia falando-lhe para calçar botas, que ia atravessar ruas cheias de lama, depois da tempestade na noite anterior. ”Um charco só”, ela disse, acrescentando:

— Preste bem atenção ao que vou dizer: “Discernimento”

Ao que a sobrinha respondeu:

— Sim, minha tia!

Marina acordou e, por alguns momentos, achou que estava na humilde casa no interior do Maranhão, e já há algum tempo morava em Brasília. Tudo isso acontecia talvez porque a cidade de Cocais lembrava sua antiga cidade natal.

Dias depois, queria lembrar a palavra chave que a tia lhe dissera em sonho. Lembrou:

 “Discernimento”.

Marina permaneceu apenas dois dias na cidade indiciada, comprovando o rombo nas contas da prefeitura. O prefeito simplesmente justificava a oferta da propina que fazia à fiscal, alegando que ela estava noiva, com despesas do casamento. A corrupção começava a grassar no país. Deu um aperto no coração. Dava para sentir na alma a pobreza daquela gente, inaceitável o desvio do dinheiro público. Havia necessidade de medidas disciplinares urgentes.

 "Discernimento", uma observação deveras pertinente, já que em toda sua vida a tia de Marina exercera a profissão de educadora e destacada professora do ensino fundamental. Tempo em que a honestidade e a palavra empenhada valiam mais que tudo. Duas irmãs: sua mãe e sua tia, ambas com os mesmos valores, mulheres bem-sucedidas em suas profissões de educadoras. Menos em suas escolhas de parceiros para a vida em comum. “Educar adulto é mais difícil, tem que começar da criança”, pensou Marina. E se tenha a educação como bússola.

“Discernimento"  - o que lá do outro lado diria sua tia aos jovens de hoje!...  



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