sábado, 5 de janeiro de 2019







 POEMA





FERNANDO PESSOA

                

     

Por que choras do que existe
A terra e o que a terra tem?
Tudo nosso — mal ou bem —
É fictício e só persiste
Porque a alma aqui é ninguém.

Não chores! Tudo é o nada
Onde os astros luzes são.
Tudo é lei e confusão.
Toma este mundo por´strada
E vai como os santos vão.

Levantado de onde lavra
O inferno, em que somos réus
Sob o silêncio dos céus,
Encontrarás a Palavra,
O nome interno de Deus.

E, além da dupla unidade
Do que em dois sexos mistura
A ventura e desventura,
O sonho e a realidade,
Serás quem já não procura;

Porque, limpo do universo,
Em Cristo nosso Senhor,
Por sua verdade e amor,
Reunirás o disperso
E a Cruz abrirá em Flor.

                                   6-2-1934



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