quinta-feira, 10 de janeiro de 2019


POESIA- T. S. ELIOT


                                    A VIAGEM DOS MAGOS






“Foi um frio que nos colheu
Na pior quadra do ano
Para uma viagem, e longa era a viagem:
Os caminhos submersos e o tempo adverso
Em pleno coração do inverno.”
E os camelos escoriados, o casco em chagas, indóceis,
Jaziam em meio à neve derretida.
Foram momentos em que recordamos
Os palácios estivais sobre penhascos, os terraços,
As sedosas meninas que nos traziam afrodisíacos.
E depois os cameleiros que imprecavam e maldiziam
E desertavam, e exigiam fêmeas e aguardente.
E os fogos da noite em bruxuleio, a falta de apriscos,
As cidades hostis, as vilas inóspitas,
As aldeias sujas e tudo a preços absurdos.
Foi uma rude quadra para nós.
Ao fim preferimos viajar à noite,
Dormindo entre uma e outra vigília,
Com vozes que cantavam em nosso ouvido, dizendo
Que tudo aquilo era loucura.

E eis que alcançamos pela aurora um vale ameno,
Úmido sob a linha da neve, impregnado de aromas silvestres,
Com um regato e um moinho a fustigar as trevas,
E três árvores contra o céu baixo recortadas,
E um velho cavalo branco a galope pelo prado.
E chegamos depois a uma taverna com parras sobre vigas;
Seis mãos se viam pela porta entreaberta
A disputar peças de prata com seus dedos,
E pés que golpeavam os odres já vazios.
Mas nenhuma informação nos deram, e então seguimos
Para chegarmos ao lugar; foi (podeis dizer) satisfatório.

   Tudo isso há muito tempo se passou recordo,
E outra vez o farei, mas considerai
Isto considerai
Isto: percorremos toda aquela estrada
Rumo ao Nascimento e Morte? Um nascimento, é certo,
Tínhamos prova, sem dúvida, Nascimento e morte contemplei,
Mas os pensara diferente; tal Nascimento era, para nós,
Amarga e áspera agonia, como a Morte, nossa morte.
Regressamos às nossas plagas, estes Reinos,
Porém aqui não mais à vontade, na antiga ordem divina,
Onde um povo estranho se agarra aos próprios deuses.
Uma outra morte me será bem-vinda.

Tradução de Ivan Junqueira


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