terça-feira, 17 de setembro de 2019

CONTO




                                         TERROR NA LUA DE MEL






Um dia Meira ia casar com Celso, moravam próximos, mas pouco se conheciam. Bons relacionamentos são importantes, em especial para que aconteça uma união conjugal de sucesso. Diferenças culturais podem dar  problema, o que não é, nem nunca foi, uma verdade inconteste. Mas, como se diz, problema é para ser resolvido. Há os problemas que a gente cria, e o que os outros criam para nós. E há os fantasmas que aqui e ali assombram, vindos do passado, também os que surgem no presente.

  Já naquela época, Meira era  uma moça “empoderada” , seus pais com boa situação financeira, mas longe de serem ricos. Tinha a mesma idade do jovem que passava em frente da casa, lançando olhares para sua janela. Chegaram a ficar noivos de outras pessoas, sem  trocar alianças. Até que Celso resolveu ir adiante na conquista pelo coração de Meira, já havia realizado algumas  investidas. Não demorou muito e estavam  noivo, com casamento marcado.

Às vésperas de assinarem os papeis, que os tornariam  marido e mulher, Meira sentiu que estava sumindo aquela sensação de triunfo ao noivar com o dono daquele sedutores olhos verdes, pouco confiáveis, dizia a lenda. Ela era assídua leitora de Stephen King, e acabara de ler O Iluminado. Passou a perscrutar no seu íntimo se  Celso poderia um dia a se tornar um maníaco  sexual, ou algo no gênero terror.

Era como se pedaços dentro dela houvessem se soltado, que devia juntar. Ou restaurar a fratura de um membro após um grave acidente. Mas acreditava que Deus nunca ia permitir uma coisa assim, já que ela nunca faltava às missas dominicais, e ainda ajudava o padre como catequista. Tirou a ideia da cabeça, viu que ele continuava, sim, a ser uma pessoa que cabia como uma luva nos seus sonhos. Tomada por uma compulsão, não parava de falar para o noivo que estava ótima, completa, sentindo-se iluminada.

Já casados, em viagem de  lua de mel, na cidade de Maceió, onde iam também residir, ao chegarem observaram nuvens escuras no céu. Nada a temer, iam estar abrigados no melhor quatro estrelas da cidade. Uma carta espera por Celso, e é com certa apreensão que ele lê seu conteúdo, e de imediato cai em prantos. Para completar a cena, a tempestade  prenunciada, desaba, com trovões e relâmpagos. O tempo ruim lá fora e não menos assustador entre quatro paredes. Meira, quis então saber o que a carta dizia, e fizera o marido derramar tantas lágrimas. 

Sem revelar nada, Celso disse apenas que ia ver os alagamentos perto dali, já que a TV dava notícias alarmantes, e ele estava sempre pronto para ajudar. Antes de sair, volta-se para elar e fala:

— A vida é mesmo uma m.....

Meira fez menção de acompanhá-lo, mas foi impedida de sair do quarto.

 Durante toda a noite a recém-casada aguardou o marido. No dia seguinte encontra a correspondência recebida por Celso na mesinha da saleta contígua, e algum dinheiro junto. Leu o conteúdo sentada em frente à janela que dava para um jardim que começava a florir, e eles não tiveram tempo de apreciar, era início de primavera, as chuvas chegaram antecipadas. E assim como os relâmpagos assustaram Meira no dia anterior, do mesmo modo foi a notícia da carta, onde estava escrito que o pai de Celso engravidara uma menor de idade, e os parentes dela ameaçavam matá-lo. O sedutor resolvera então sumir.

Enquanto sua família esfacelava-se em João Pessoa, Celso  dava início à sua vida de casado,o que não lhe parecia justo.  O irmão mais moço cobrava sua presença, o que sempre fez o irmão do meio acudir os familiares.  Antes de mudar-se para a cidade do novo emprego, Celso passou um dia na casa de uma tia que recebia mensagens do além, via coisas estranhas. Fez uma consulta, e recebeu a notícia que o sobrinho, prestes a casar, ia ter uma grande tristeza após as bodas. Celso pensou em morte. Premonição revelada agora na carta trazida pelo Correio, que costuma atrasar, mas dessa vez foi pontual. 

Três dias se passaram e o marido de Meira não havia retornado. Hora de deliberar o que fazer. O casamento não se consumara, mesmo assim ela resolveu não voltar para casa dos pais. Ia procurar emprego e ficar na cidade que amou assim que nela pôs os pés. E no que diz respeito a esses fatos extraordinários, Meira, em toda sua vida, só tinha visto Uri Geller entortar colheres na TV. 

Meira não se fez de vítima, tomou as rédeas da própria vida, foi ser recepcionista numa clínica médica e passou a estudar para seguir a profissão de dentista, outro sonho, que abandonara para casar. Ainda noiva tivera aquele “pressentimento”, mas jurou a si mesma que ia se recuperar do trauma sofrido com o casamento. Mesmo que uma vez ou outra sentisse um aperto no coração, o que jamais deixou de sentir. 

Celso ainda quis remediar a situação, mas o que estava feito estava feito. Exímio surfista, também impulsivo e exagerado, dois anos depois, resolveu enfrentar o mar revolto de Nazaré em Portugal, com as ondas mais altas do mundo. Teve ali um ataque cardíaco e morreu. Mas a vida continua, pensou Meira, uma outra mulher, não mais aquela, cujo maior sonho era casar com Celso.  

 

  

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