segunda-feira, 2 de setembro de 2019





CONTO


                  ROUBO  NA COBERTURA

                                                              MARIA VILMA MUNIZ


Hermínia já estava perto de casa, resolveu retornar para ficar um pouco mais olhando as vitrines na av. N.S. de Copacabana, bem melhor iluminada e  com menos movimento de gente e carros. Perscrutou o céu, não queria ser surpreendida com a chuva, comum naquela época do ano, o tempo meio suspeito. Sentiu alguém bem perto de si, ficou apreensiva, e voltou-se, viu que era o Paulo. Ele então falou com ar de inocência:

— Oi, prima, assustei você?

—Claro, quase podia senti-lo roçando minhas costas.

—Distraída andando por aí, não tem medo? Parece que você ficou espantada quando viu que era eu. Seu primo é apenas um pobre desempregado, mas não morde.

—Bobagem!...

—Você está certa em ficar desconfiada, hoje em dia o inimigo está  à espreita em cada esquina. Todo cuidado é pouco, tem muita gente ruim por aí, é bom não dar moleza, não se iludir com as pessoas. Penso nas joias roubadas da sua irmã, um crime que parece sem solução.

—Realmente há muito o que temer, infelizmente. Agora estou desconfiada de você, Ricardo, já que mora em S. Paulo, e eu não soube que estava por aqui. KKKKK. Aquelas joias Estela mereceu  tê-las, o muito que batalhou ao lado do marido. O roubo aconteceu pouco antes da separação. Foi ele quem deu parte à polícia.

—Estava indo para sua casa, visitar os tios e ver você, lógico. Ainda não tive oportunidade de falar com Estela. Não avisei, porque gosto de fazer surpresa.

—Veja como somos diferentes, eu odeio surpresas, e ser surpreendida desse jeito só tenho a dizer que me sinto incomodada.

— Perdão, e já que pretende ficar mais tempo na rua, vamos até  o MCcafé aqui perto e conversar um pouco. Outro dia tive um sonho com sua mãe, ela me pareceu aflita. Soube pouco depois do roubo das joias, e que não há pista do ladrão. Mas vão-se os anéis e fiquem os dedos, já dizia nossa avó Josefina.

— As joias estavam dentro de uma frasqueira, que ela havia guardado no closet da cobertura antes de separar do Raul. A polícia não encontrou evidências que pudessem incriminar o encanador que veio consertar a torneira do banheiro da suite, um senhor de meia idade, que não tem pinta de ladrão.

Enquanto caminhavam ele pensou: “Será que ela não se perturba, por não conseguir imaginar  o  quanto  a situação é constrangedora para todos?”.  Fez uma parada um pouco brusca e falou:

— Você não está interessada em saber quem foi que o ladrão?

— Não fui eu nem você, certo? Uma casa como a nossa onde andam parentes, agregados, visitas, tanta gente que vem e via.

Tinham chegado ao destino e já sentados e os pedidos feitos à atendente, continuaram a mesma conversa. Ele falou:

— Ninguém pode afirmar nada, mas todos que andam, ou andaram por lá são suspeitos. Mas acho que o mistério do roubo jamais vai ser descoberto. Um crime perfeito? Como descobrir o autor quando a vítima parece esconder alguma coisa. A polícia sem ter com que trabalhar, já que  a interessada  não fala tudo o que sabe.

— Nós temos mais condição que a polícia de descobrir. É falar agora ou calar para sempre. O que você acha?

— Tenho cá minhas desconfianças, mas não quero ser injusto com ninguém. Acusar um inocente não é coisa que se faça.

—Dê seu palpite. De minha parte prefiro não especular nada. Detesto esse assunto.

— Enquanto isso, somos todos suspeitos. Eu mesmo andei por lá na ocasião.

— Como o crime pode atingir algum de nós, seria bom que o ladrão tivesse consciência e confessasse tudo. Passamos a desconfiar uns dos outros. Tem o caso da prima Cecília que visitou Estela no dia que as joias sumiram...

— Imaginação sua!

— Enquanto eu imagino coisas, você não imagina nada, não sei se lhe dou os parabéns, ou lastimo sua atitude. Também não adiante muito especular, só vale ter certeza.

—O certo é que roubar a própria família não é tão impossível de acontecer. Aonde você está hospedado?

Paulo prometeu a Hermínia aparecer em sua casa no dia seguinte. Falou que estava com amigos no Grajaú. Despediram-se.


Pasmem leitores, o ladrão não poderia aparecer, isso porque não houve roubo algum.  Ester tinha motivo para não dar maiores esclarecimentos aos policiais nem a ninguém, sobre o roubo de suas joias. Não houve roubo algum, sua dona para não ter que dividir os valores com o ex marido guardou em segredo as peças na Caixa Econômica.    


Nenhum comentário:

Postar um comentário